Astrocitoma  de  células  granulares  do  cérebro. 
Página de resumo do caso.
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Clique para páginas detalhadas sobre : exames de imagem : 2011, 2012;  histologia - HE, colorações especiais (Masson, PAS), imunohistoquímica (GFAP, VIM, nestina, CD34, CD68, HAM-56, S-100, NF, CD99, Ki-67, p53), microscopia eletrônica (Karnovsky, parafina). Comentários: (1) (2). Texto sobre astrocitoma de células granulares. 
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Masc. 68 a.  Encaminhado de outro serviço com crise convulsiva, seguida de afasia motora e hemiparesia direita.  Sintomas melhoraram com corticosteróides. Antecedentes – hipertenso e cardiopata crônico. Infarto agudo do miocárdio há 16 anos.  Exame – sonolento, contato pobre, compreensão preservada, obedece a comandos simples. Discreta assimetria de força muscular E > D. Pupilas isofotorreagentes. Movimentos oculares externos e mímica facial preservados.   Exames de imagem - abaixo.  Realizada excisão cirúrgica da lesão.  Submetido a radio- e quimioterapia.  Em 7/7/11 - nova RM aponta persistência de áreas impregnadas na lacuna cirúrgica e possível propagação contralateral.   Em 6/1/12 (um ano após início dos sintomas) – reinternado por deterioração neurológica progressiva. Nova RM  – grande lesão frontal esquerda sólido-cística com efeito de massa, infiltrando o corpo caloso e invadindo o hemisfério contralateral.  Optado por tratamento paliativo. 
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Resumo dos achados de imagem. Exames iniciais mostram lesão sólido-cística frontal esquerda, cujo componente sólido e paredes do cisto se impregnam por contraste.  Exérese cirúrgica.
TC com contraste 30/12/2010.  RM. T1 com contraste 6/1/2011
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RM controle,  7/7/2011.  Persistência de tecido com impregnação por contraste na margem da lacuna cirúrgica e focos de captação na substância branca do hemisfério oposto (provável disseminação pelo corpo caloso). No FLAIR, hipersinal na substância branca dos dois hemisférios. 
T1 sem contraste T1 com contraste FLAIR
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RM após 1 ano,  9/1/2012.  Recidiva local como lesão sólido-cística e disseminação contralateral via corpo caloso, com áreas impregnadas neste e na substância branca do hemisfério oposto.  Hipersinal em T2 e FLAIR na substância branca dos dois hemisférios. 
T1 sem contraste T1 com contraste FLAIR
Coronais, T1 com contraste T2
Sagital, T1  T1 com contraste
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Achados  histológicos.   Obtidos quando da cirurgia no início do quadro. Não houve intervenções posteriores. Podem ser divididos em neoplasia propriamente dita (astrocitoma difuso de alto grau) e células granulares infiltrando a substância branca. No conjunto, firmam o diagnóstico de um raro astrocitoma de células granulares do cérebro. Clique para comentários (1) (2), texto e literatura sobre a entidade. 
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Correlação imagem - histologia.    Abaixo, tentativa de correlação entre a ressonância magnética em corte axial, T1 com contraste, e dois cortes corados por HE (selecionados dos sete disponíveis). O tumor era sólido-cístico, com o nódulo mais sólido em posição medial (corresponde aos fragmentos na foto à esquerda). Aí estavam as áreas mais ricas em tecido neoplásico, mas células granulares só estavam presentes em um dos fragmentos.  O outro corte, à direita na foto, contém um segmento da margem do cisto, com uma orla de tecido tumoral viável que aparece em roxo (basófilo).  As células granulares são abundantes neste segundo fragmento, e infiltram a substância branca subcortical próxima ao tumor. São melhor vistas com PAS, imunohistoquímica para nestina, CD34 e CD68, e microscopia eletrônica. O conteúdo do cisto era provavelmente líquido, aspirado no ato cirúrgico.
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Parte sólida do tumor. Aqui são apresentadas lâminas escaneadas coradas por HE e por tricrômico de Masson (TM). O fragmento embaixo e à esquerda era constituído por substância branca infiltrada pelas células granulares do tumor.  Os demais continham tumor astrocitário de alto grau histológico, que será discutido abaixo. Uma área de fibrose, que poderia qualificar como gliossarcoma, é melhor visualizada com tricrômico de Masson. 
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Lâmina  escaneada da margem do cisto.

A lâmina, corada por HE, representa a parede do cisto tumoral e a substância branca próxima. O tecido basófilo da margem do cisto é constituído por glioma de alto grau. Na substância branca em continuidade, há infiltração por células granulares, que são astrócitos modificados, ricos em lisossomos.  Para destaques da histologia em HE, clique

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Lâminas  escaneadas da margem do cisto. A comparação da lâmina de HE com três antígenos dá idéia da topografia da lesão em relação ao córtex e substância branca. Com vimentina, o córtex não se marca, aparecendo em azul pálido. As áreas marcadas são de substância branca. Os resultados com CD34 e CD68 são semelhantes. Nos dois, a orla de tecido tumoral viável que margeia o cisto é positiva, bem como a faixa de substância branca infiltrada pelas células granulares do tumor. Clique nos antígenos para detalhes. 
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Destaques  da  microscopia (HE, colorações especiais).  Clique para destaques da imunohistoquímica e microscopia eletrônica
HE.  Aspecto geral.  Neoplasia astrocitária de feições variadas, com predomínio de astrócitos gemistocíticos.  Atipias nucleares, pleomorfismo celular Pseudoinclusões intranucleares
Mitoses típicas e atípicas. Infiltrado linfocitário perivascular. Escassez de proliferação endotelial.  Necrose coagulativa. 
Margem do cisto tumoral - boa delimitação em relação ao tecido nervoso.  Células granulares na substância branca peritumoral.  Astrócitos gemistocíticos na substância branca peritumoral. 
Masson.  Areas ricas em fibras colágenas envolvendo células neoplásicas lembram gliossarcoma Células granulares na substância branca peritumoral. PAS.  Células granulares na substância branca peritumoral (grânulos = lisossomos, PAS-positivos).
Destaques da imunohistoquímica a seguir;  microscopia eletrônica
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Destaques  da  imunohistoquímica no tumor (astrocitoma de células granulares). 
GFAP.  Área com células positivas, semelhantes a astrócitos gemistocíticos.  Área com alternância de células GFAP-positivas e negativas Área com predomínio de células GFAP-negativas entremeadas a fibras colágenas (compatível com gliossarcoma)
VIM.  Positiva no citoplasma das células tumorais. CD34. Positividade variável nas células neoplásicas, na maioria em padrão membrana.  CD68.   Positiva variável no citoplasma das células tumorais.
HAM-56. Negativo nas células tumorais, positivo na micróglia. S-100.  Positiva no citoplasma de algumas células tumorais, negativa nos núcleos. NF. Negativo nas células tumorais, positivo em axônios infiltrados pelo tumor
CD99. Positividade variável nas células neoplásicas, em padrão membrana.  Ki-67. Marca cerca de 10-15% dos núcleos das células do tumor p53. Resultados semelhantes. 
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Destaques  da  imunohistoquímica nas células granulares infiltrando a substância branca. 
GFAP.   Células granulares negativas, contrastando com astrócitos gemistocíticos VIM. Positividade citoplasmática nas células granulares Nestina. Positividade citoplasmática nas células granulares
CD34.  Positivo nas células granulares, padrão membrana CD68. Positividade nos grânulos citoplasmáticos  (lisossomos) Ki-67. Positivo em núcleos esparsos de células granulares.  p53
Células granulares - negativas para HAM-56, NF, CD99, S-100(com exceções, positividade nuclear em algumas células).
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Destaques  da  microscopia eletrônica. 
Material fixado em Karnovsky
Aspecto geral - células tumorais. Citoplasma rico em lisossomos, núcleo excêntrico, muitas células circundadas for fibras colágenas.  Lisossomos - complexos, grande variedade de forma, tamanho e aspecto morfológico.  Retículo endoplasmático liso e rugoso abundante, por vezes com grande dilatação das cisternas. 
Células poligonais agrupadas. Estas com poucos lisossomos, limites nítidos, em íntimo contato pelas membranas.  Pseudoinclusões intranucleares. Lingüetas de citoplasma em dobras da membrana nuclear.  Mitose.  Placa metafásica típica. 
Material reprocessado pós inclusão em parafina
Células granulares que infiltravam a substância branca. Citoplasma riquíssimo em lisossomos, pobre em filamentos intermediários.  Lisossomos das mais variadas formas povoavam o citoplasma das células granulares Astrócitos gemistocíticos  coexistiam com as células granulares na substância branca. 
Filamentos intermediários. Principal constituinte do citoplasma dos astrócitos gemistocíticos reacionais.  Coexistência de células granulares e astrócitos gemistocíticos em contato Axônios mielínicos  entre as células granulares e astrócitos gemistocíticos na substância branca
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Comentários. O caso ofereceu considerável dificuldade, consumiu meses de esforço e passou por mais de uma hipótese diagnóstica, por isso decidimos apresentá-lo em detalhe. 

Inicialmente, o caráter bem delimitado do tumor, ilustrado pelo tecido na margem do cisto, nos fez pensar em uma metástase. Não parecia ser epitelial, assim consideramos a hipótese de melanoma metastático. S-100 era positivo, HMB-45 negativo. O GFAP era positivo em poucas células no bloco escolhido para a reação, o que foi considerado resultado espúrio. 

Voltamos ao caso por ocasião da recidiva, alertados pelos neurocirurgiões, quando a clara disseminação contralateral à maneira dos gliomas demonstrada em RM, afastou em definitivo a idéia de uma metástase. 

Refizemos a imunohistoquímica e nos chamou atenção a reação para CD34, que destacou as células granulares. Na HE, haviam passado despercebidas. CD34 foi pedido para estudar os vasos, não as células tumorais, assim o achado, puramente fortuito, foi surpresa. 

A natureza das células granulares nos causou problemas. Foram negativas para GFAP, como aliás, grande parte das células neoplásicas nas áreas de glioma (colaborou para afastarmos glioma como primeira hipótese). Como pareciam macrófagos, tentamos CD68 e HAM-56, com resultados conflitantes. Foram positivas para CD68, como muitas das outras células do tumor, e negativas para HAM-56.  A positividade para CD68 nos levou a considerar a hipótese de uma histiocitose. Depois ficou claro que o CD68 foi positivo porque as células são ricas em lisossomos, e CD68 marca estas organelas. Já HAM-56 não marca lisossomos, e o antígeno que identifica nos macrófagos é desconhecido. Como as células efetivamente não são de linhagem histiocitária, e sim glial, fica claro o motivo da discrepância. 

Repetimos a IH usando mais blocos e concluimos que as áreas positivas para GFAP não poderiam ser espúrias. O que havia era uma grande variabilidade na reação, com muitas células, e até áreas inteiras do tumor, totalmente negativas para GFAP. Eram células neoplásicas de linhagem astrocitária que não expressavam o filamento intermediário próprio da mesma. 

Para estudar melhor as células granulares, fizemos microscopia eletrônica em material fixado em Karnovsky no ato cirúrgico e em um pequeno bloco obtido da substância branca rica em células granulares, reprocessado a partir da parafina. Ambos preparados mostraram que as células granulares eram riquíssimas em lisossomos, o que explicou a reação para CD68. A pobreza em filamentos intermediários permitiu compreender a negatividade para GFAP. 

Estudo da literatura nos levou então a fechar o caso como um raro astrocitoma de células granulares do cérebro. A entidade, muito rara, é discutida sinteticamente, mas com grande precisão, no livro de patologia cirúrgica do sistema nervoso co-autorado pelo saudoso Prof. Scheithauer, ref abaixo. 

Em retrospecto, o caso mostra a importância do estudo conjunto dos exames de imagem, histologia em HE, colorações especiais, imunohistoquímica e microscopia eletrônica para se chegar a um diagnóstico coerente. As principais dificuldades e falácias foram : 

  • boa delimitação do tumor e negatividade para GFAP, favorecendo metástase sobre glioma;
  • células granulares de difícil identificação em HE, facilmente confundidas com macrófagos; 
  • quando sua presença foi levantada pelo CD34 (fortuitamente), sua natureza não ficou clara, pois o CD68 era positivo - pareciam mesmo macrófagos. 
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Astrocitoma de células granulares do cérebro. 

Definição.  São astrocitomas infiltrativos raros, geralmente de alto grau histológico, caracterizando-se por pelo menos parte dos astrócitos neoplásicos com citoplasma proeminentemente granular. O aspecto se deve ao acúmulo de lisossomos e vacúolos autofágicos. Há áreas de transição entre as células granulares e astrocitoma convencional. Os astrócitos granulares são reativos para GFAP (ver outro caso), e podem mostrar filamentos intermediários em microscopia eletrônica. 

Clínica. Ocorrem entre a 5a e 8a décadas, coincidindo com a faixa etária dos astrocitomas difusos comuns de graus III e IV. Clinicamente predominam efeitos de massa.  Em exames de imagem são lesões que podem aparecer bem circunscritas, císticas, com impregnação por contraste na margem do cisto, e edema da substância branca adjacente. 

Micro.  Os tumores são infiltrativos, mitoticamente ativos e por vezes necróticos. Parecem-se com os astrocitomas difusos convencionais, mas parte das células tem o citoplasma variavelmente preenchido por grânulos grosseiros, eosinofílicos (róseos), PAS positivos e diastase resistentes (não são constituídos por glicogênio). Os grânulos freqüentemente distendem o citoplasma e deslocam o núcleo para a periferia.  O limite nítido do citoplasma e o caráter granuloso poderiam levar à confusão destas células com macrófagos. Contudo, são maiores e os núcleos mais atípicos. 

Imunohistoquímica.  As células granulosas são positivas para GFAP, consistente com sua linhagem astrocitária.  Obs. Foram negativas no presente caso, mas positivas em outro

Microscopia eletrônica.  As células contêm corpúsculos preenchidos por material heterogêneo, eletrodenso, que pode ir de amorfo a lamelar. Correspondem a vacúolos autofágicos ou autofagossomos. 

Prognóstico.  Os astrocitomas de células granulares do cérebro comportam-se como gliomas de alto grau histológico. Apesar de radioterapia, esses tumores recidivam e evoluem para êxito letal geralmente antes de 2 anos. 

Fonte.   Burger, PC, Scheithauer BW, Vogel FS.  Surgical Pathology of the Nervous System and its Coverings.  4th Ed. Churchill Livingstone, New York, 2002.   pp 198-9. 

Outras referências : 

  • Brat DJ, Perry A.  Astrocytic and oligodendroglial tumors. Chapter 5  in  Perry A, Brat DJ (eds). Practical Surgical Neuropathology. Churchill Livingstone Elsevier, 2010.  p. 73. 
  • Brat DJ, Scheithauer BW, Medina-Flores R, Rosenblum MK, Burger PC. Infiltrative astrocytomas with granular cell features (granular cell astrocytomas). A study of histopathologic features, grading, and outcome.  Am J Surg Pathol 26: 750–757, 2002.
  • Geddes JF, Thom MMB, Robinson SFD, Révész T. Granular cell change in astrocytic tumors. Am J Surg Pathol  20: 55-63, 1996.
  • Joo M,  Park SH, Chang SH, Kim H, Choi CY, Lee CH, Lee BH, Hwang YJ. Cytogenetic and molecular genetic study on glioblastoma arising in granular cell astrocytoma: a case report.  Human Pathol. 2011 Dec 26  (in press). 
  • Kleihues P. et al. Glioblastoma (parágrafo sobre células granulares). In  WHO Classification of Tumours of the Central Nervous System. 4th Ed.  Louis DN, Ohgaki H, Wiestler OD, Cavenee WK (eds).  International Agency for Research on Cancer, Lyon, 2007.  p. 38.
  • Melaragno MJ, Prayson RA, Murphy RA, Hassenbusch SJ, Estes ML. Anaplastic astrocytoma with granular cell differentiation: Case report and review of the literature.  Human Pathol. 24: 805-8, 1993. 
  • Shi Y, Morgenstern N.  Granular cell astrocytoma.  Arch Pathol Lab Med  132: 1946-50, 2008.
  • Shin E, Chung CK, Park SH. Granular cell astrocytoma. Pathol Res Pract 203: 57–62, 2007.


CD68 e astrocitoma de células granulares

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  • Wierzba-Bobrowicz T, Lewandowska E, Matyja E, Dziduszko J, Koszewski W, Stepien T, Blazejewska-Hyzorek B. Granular cell astrocytoma. A case report with immunohistochemical and ultrastructural characterization. Folia Neuropathol. 2008;46(4):286-93.
  • DAKO datasheet sobre HAM-56    http://www.finels.com/product/up_files/M0632.pdf 
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