Cavernoma frontal.  -  2. HE
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Masc., 18 a. Clique para história clínica, resumo dos exames de imagem, macroscopia, aspectos sob lupa estereoscópica, destaques da microscopia em HE e tricrômico de Masson. Breve texto sobre malformações vasculares do SNC : telangiectasias, cavernomas, malformações arterio-venosas (MAVs).
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Lâminas escaneadas.   Num espécime grande, com regiões diferentes e orientação topográfica, scans das lâminas provêm uma visão mesoscópia, útil tanto para correlação com a macroscopia como para orientar o estudo microscópico. Para estas páginas, escaneamos as lâminas com 600 e 1200 dpi (dots per inch).  A resolução mais baixa dá uma impressão panorâmica, a maior permite melhor detalhe das estruturas, facilitando a transição para a microscopia com a objetiva mais fraca (4 x). Para destaques da microscopia em HE e tricrômico de Masson, clique. 
Neste corte, observamos à esquerda um segmento de um giro cerebral, e, na profundidade, o cavernoma. A possível correlação do espécime com a topografia no exame de imagem entre os dois sangramentos (período interictal) é apresentada abaixo, em interpretação livre. Por este, vê-se que o cavernoma fazia saliência na cavidade que resultou da reabsorção da primeira hemorragia. Para mais imagens deste exame, e para página de resumo dos estudos de imagem, clique. 
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O córtex cerebral vizinho à lesão mostrava um pequeno foco hemorrágico devido à manipulação cirúrgica (em cima e à esquerda, na foto). O tecido nervoso apresentava gliose e neurônios calcificados.  Entre o córtex e o cavernoma há uma área de gliose cavitada, correspondendo à substância branca da medular do giro. O cavernoma em si é constituído por vasos de paredes finíssimas, na maioria preenchidos por trombos em várias fases de evolução. Não há cápsula delimitando-o externamente, nem tecido nervoso entre os vasos. 
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Corte espelho, obtido da outra metade do espécime. Aspecto superponível. 
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Destaques  da  microscopia.   Texto sobre malformações vasculares do SNC.
HE. Cavernoma : paredes vasculares finíssimas, constituídas só por fibras colágenas e células endoteliais.  Trombo recente Trombo em organização. 
Células participantes.
Trombo em recanalização Gliose no córtex cerebral próximo  Neurônios calcificados 
Masson. Paredes vasculares Trombo recente  Trombo em organização
Trombo em recanalização Trombo antigo Trombo calcificado
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HISTOLOGIA  -  HE
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Estrutura do cavernoma, paredes vasculares.  O cavernoma é uma malformação estritamente venosa, formada por canais vasculares muito dilatados e de paredes extremamente delgadas. Na maioria, são constituídas só por uma fina camada de fibras colágenas revestidas por células endoteliais. Não há fibras musculares lisas nem lâmina elástica. Algumas paredes mais espessas podem resultar da organização de trombos. 
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Trombos recentes. 

São constituídos apenas por hemácias e fibrina, não raro com alguma estratificação.  Para tipos de trombos na Patologia Geral, clique (1) (2) (3). 

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Trombos em  organização. 

Neste espécime há vários exemplos, que eram já notados na macroscopia, sob lupa. A organização se inicia a partir de uma área aderida à parede do vaso. Células inflamatórias e macrófagos digerem a fibrina e as hemácias.  Admite-se que células endoteliais e/ou células totipotentes da própria parede do vaso migrem para o interior do trombo e se transformem em fibroblastos, originando fibras colágenas. Esta transição é especialmente bem vista com tricrômico de Masson

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Comparação entre macro, meso e microscopia de trombos em organização em um cavernoma. No espécime fotografado sob lupa, a parte organizada do trombo está aderida à parede do vaso e aparece em branco, pois as hemácias nesta parte desapareceram. Há camadas mais róseas e mais brancas, indicando que o processo ocorre por etapas. A parte mais distal, que se projeta para a luz do vaso, é rósea por ainda conter hemácias.  Nas lâminas, a parte mais organizada está à direita e aparece rósea no HE e azul no Masson, devido à deposição de fibras colágenas. Clique para as páginas de macroscopia e tricrômico de Masson
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Trombos em organização.  Células.   Na parte recente do trombo, constituída por hemácias e fibrina, começam a ser vistas células conjuntivas que lembram fibroblastos pelo seu núcleo grande, ovalado, cromatina frouxa, com nucléolo, e citoplasma alongado e fusiforme.  Estas células vão depois depositar colágeno e também se diferenciam em células endoteliais para criar novos capilares (recanalização). 
Na parte do trombo com organização mais avançada, as hemácias e fibrina foram substituídas por células inflamatórias crônicas, principalmente macrófagos, que apresentam citoplasma vacuolado (xantomatoso) por conter abundante material fagocitado, principalmente lípides. Há também grânulos de hemossiderina, resultante do ferro que existia na hemoglobina das hemácias. 
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Trombos organizados / recanalizados.    A fase final do processo, depois da fagocitose, é a deposição de fibras colágenas (organização) e formação de novos capilares (recanalização). 
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Córtex cerebral com  gliose. 

O córtex do giro vizinho à lesão apresenta alterações cicatriciais (gliose), com proliferação de astrócitos reacionais. Detalhes abaixo. 

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Gliose. 

A gliose no tecido nervoso equivale, grosseiramente falando, à fibrose nos outros tecidos. As células que reagem à lesão são os astrócitos, que ficam aumentados de volume e produzem grande quantidade de seu filamento intermediário no citoplasma, o GFAP. 

Ao lado, vemos uma área de gliose do tipo pilocítico, que ocorre em torno de lesões extremamente crônicas, como este cavernoma. Neste tipo pode haver formação de fibras de Rosenthal.   Outra situação em que ocorre caracteristicamente gliose do tipo pilocítico é em torno de craniofaringiomas

Astrócitos gemistocíticos.  São a forma mais comum de astrócito reacional a qualquer tipo de lesão, e se caracterizam por seu citoplasma abundante e róseo, com núcleo excêntrico. É de interesse que alguns deles contêm grânulos de hemossiderina, o que não é habitual em outros tipos de lesão. No caso, como há muitos sangramentos a partir do cavernoma, o tecido fica riquíssimo em ferro, que é captado também pelos astrócitos, saturando suas moléculas de ferritina. A ferritina saturada aglomera-se dando hemossiderina (pigmento marrom). Para mais sobre metabolismo do ferro e hemossiderose local, clique. 
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Hemossiderose.  A deposição de grânulos de hemossiderina é comum, tanto nos trombos em organização como no interstício do cavernoma. 
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Neurônios mineralizados.  Calcificação de neurônios necróticos é incomum, pois geralmente desaparecem rapidamente após a necrose, sem deixar traço.  Este espécime é especialmente rico nesta rara alteração, presumivelmente porque as células ficaram impregnadas por sais de ferro e (possivelmente também) cálcio (siderocalcinose). A mineralização parece ocorrer apenas no citoplasma, pois o espaço correspondente ao núcleo muitas vezes permanece vazio.  Clique para exemplos de siderocalcinose em pequenos vasos (1) (2) (3).  Para confirmar a presença de ferro e cálcio, são necessárias as colorações especiais de Perls e von Kossa, não realizadas no presente espécime. 
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Malformações vasculares do sistema nervoso central. 

Malformações vasculares são classificadas com base em : 1) calibre, configuração e composição histológica dos vasos componentes;  2) continuidade com vasos cerebrais normais;  3) relação dos vasos da malformação com o parênquima.  Os tipos propostos a seguir não são estanques, podendo haver formas de transição, especialmente nos espécimes menores. 

Telangiectasias capilares.  Estas são as lesões mais inofensivas do grupo, raramente sintomáticas. Persistem por toda a vida e são achados incidentais de exames de imagem ou necrópsia. Angiograficamente, aparecem como uma mancha nebulosa, freqüentemente na ponte. Histologicamente, são agregados de pequenos vasos dilatados, de paredes finas, dispersos por uma região de parênquima inalterada por gliose ou hemossiderose.  Para exemplo, associado a displasia cortical, clique

Cavernomas ou hemangiomas cavernosos. 

Definição. São malformações vasculares não arteriais, usualmente em adultos, mas podem ocorrer também em crianças. Estudos em autópsias sugerem incidência em 0,5 a 0,7% da população. Podem ficar assintomáticas muitos anos e ser descobertas incidentalmente em estudos de imagem por outros motivos.  Podem manifestar-se por hemorragias, freqüentemente recorrentes, e causar epilepsia (especialmente em lesões que envolvem o córtex cerebral). As duas complicações justificam sua remoção cirúrgica. As hemorragias são geralmente menores e menos graves que as das malformações artério-venosas (MAVs), pois o sangue não está sob pressão arterial. Contudo, hemorragias repetidas vão levando a alterações neurológicas progressivas ou epilepsia intratável.  Cavernomas em tronco cerebral podem causar déficits multissistemáticos ao comprometer diversas vias e núcleos de nervos cranianos. 

Imagem.  A lesão típica é bem visualizada apenas em ressonância magnética (RM). Consiste em um foco bem definido de pequenos vasos ou nidus, circundado por uma orla de parênquima nervoso hemossiderótico (que dá ausência de sinal em T2). A seqüência com gradiente eco é especialmente adequada, porque nesta a hemossiderina aparece fortemente negra e aumenta a sensibilidade para detectar lesões menores. Em T1, pode assumir o clássico aspecto em pipoca, alternando áreas de hipersinal (relacionadas à metemoglobina de trombos recentes), com áreas de hipossinal pela hemossiderina. Algumas lesões podem calcificar, e daí tornar-se observáveis na tomografia computadorizada. Não aparecem na angiografia digital, pois o fluxo sanguíneo pelos cavernomas é extremamente lento, e não há um shunt artério-venoso, que caracteriza as malformações artério-venosas ou MAVs

Topografia. Cavernomas ocorrem em qualquer lugar do cérebro, freqüentemente superficiais, envolvendo córtex, substância branca e meninges. Podem ser observados em estruturas profundas, como núcleos da base, tálamo, hipotálamo e tronco cerebral.  Podem ser múltiplos. 

Macro. O cavernoma é uma massa compacta de pequenos vasos entrelaçados. Macroscopicamente as lesões são lobuladas, bem circunscritas, e podem variar em diâmetro de alguns milímetros a vários centímetros. A superfície de corte é vermelha escura e tem textura esponjosa. O aspecto pode ser variegado devido à justaposição de áreas com hemorragia, trombos em várias fases de organização, calcificações, fibrose, degeneração xantomatosa e hemossiderose. Ao contrário das MAVs, não há contribuição arterial, por isso a circulação do sangue por elas é extremamente lenta. Pelo mesmo motivo, não aparecem em estudos angiográficos. Os vasos são de paredes muito delgadas e nem sempre distinguíveis macroscopicamente. Vários contêm trombos em diferentes fases. O cérebro que circunda a lesão tem tonalidade ferruginosa pela hemossiderose. 

Micro.  Os vasos são de espessura e contornos altamente variáveis. Alguns são finíssimos, compostos apenas por uma delgada camada de colágeno revestida por endotélio. Outros são espessos e hialinizados. Os vasos não contêm fibras musculares e não têm o aspecto de artérias ou veias visto nas MAVs. Estão intimamente justapostos (back to back), com mínima quantidade de tecido cerebral gliótico de permeio. Vários trombos mostram organização e recanalização.  Há também freqüente calcificação nos trombos antigos, e até ossificação. 

Prognóstico.  A freqüência do sangramento inicial é estimada em 1% por lesão por ano. Após o primeiro icto, a freqüência de ressangramento aumenta consideravelmente para 2,6 a 13% por paciente ano, esta diferença refletindo o número variável de lesões por paciente. Fatores predisponentes incluem sexo feminino, gravidez, formas múltiplas ou familiares, e irradiação ou hemorragia prévias. 
 

Malformações artério-venosas ou MAVs. 

Definição. São malformações vasculares com shunt artério-venoso. Correspondem a 1,5 a 4 % de todas massas intracerebrais, com pico de incidência em adultos jovens entre 20 e 40 anos.  Podem ocorrer em qualquer localização, mas a maioria é encontrada na porção supratentorial. A explicação mais plausível para a patogênese das MAVs é a ausência congênita de uma rede capilar que se interponha entre artérias e veias na região da malformação. O curto-circuito sanguíneo eleva a pressão intraluminal na parte venosa, produzindo ectasia e muscularização das veias. Desta forma, são criados vasos híbridos, com características tanto de artérias como de veias, de modo que, freqüentemente, não é possível distingui-las. 

Clinicamente, a lesão aumenta insidiosamente, tornando-se sintomática entre a segunda e quinta décadas. Há cefaléia, hemorragias, convulsões e déficits neurológicos focais. Em crianças pequenas, o shunt pode ser suficiente para dilatar a veia de Galeno (assim chamado ‘aneurisma da veia de Galeno’) e causar falência cardíaca. 

Hemorragias de MAVs correspondem a 2% dos acidentes vasculares cerebrais. Em uma grande série, a idade média ao diagnóstico foi de 31 anos e a distribuição é igual nos dois sexos. Em cerca de metade dos pacientes a apresentação inicial é por uma hemorragia. Convulsões inauguram o quadro em 25%. Mais raramente, cefaléia insidiosa e déficits neurológicos focais são encontrados à medida que a MAV cresce. 

Grandes MAVs produzem atrofia do cérebro ao redor devido ao fenômeno do roubo (steal phenomenon). Este se deve a que a velocidade do fluxo do sangue pela malformação compromete a irrigação dos tecidos vizinhos. Cerca de metade das MAVs acompanham-se de aneurismas cerebrais do tipo sacular (berry aneurysms) que se formam em pontos de bifurcação das artérias suprindo a MAV (clique para exemplo). 

Imagem.  Os vasos dilatados e tortuosos são facilmente observados em TC e RM. Nesta última, o alto fluxo leva à ausência de sinal, ou flow-void (vazio de fluxo) (os vasos aparecem em negro). Na angiografia há curto-circuito artério-venoso, com enchimento precoce dos vasos de drenagem. 

Macro. As MAVs ocorrem dentro dos territórios de distribuição das grandes artérias cerebrais (artéria cerebral média > anterior > posterior). São múltiplas em 4% dos casos. Os vasos dilatados podem se visualizados por transparência através da leptomeninge espessada e, às vezes, ferruginosa devido à hemossiderose. Mais profundamente, os vasos dilatados e entrelaçados, de paredes espessas, mergulham no tecido cerebral. Pode haver calcificação dos vasos ou do tecido cerebral gliótico entre eles. 

Micro.  Os vasos da MAV se caracterizam por grande diversidade. Alguns são finos e sem musculatura lisa, lembrando veias, outros têm camada média e lâmina elástica interna, como artérias. Vários são híbridos, associando ambas feições, por vezes de forma aberrante, por exemplo, com reduplicação da membrana elástica interna.  Entre os vasos costuma haver ilhotas de parênquima nervoso, que é freqüentemente gliótico e/ou hemossiderótico. Na porção central, o nidus da MAV, os vasos são densamente aglomerados e a quantidade de parênquima é mínima. Há calcificações tanto nos vasos como no tecido intersticial.  MAVs podem ser embolizadas antes da tentativa de excisão cirúrgica, e o material usado, como o Onyx®, pode ser visualizado dentro dos vasos (clique para exemplo).  MAVs irradiadas, especialmente por radiocirurgia (outra modalidade de abordagem terapêutica), podem mostrar fibrose. 

Prognóstico. Dois terços dos pacientes com MAVs sofrem hemorragia cerebral clinicamente significativa, com mortalidade de 10% e seqüelas permanentes de 30 a 50%.  A taxa de hemorragia em MAVs não tratadas é de 2 a 4% por paciente por ano. O risco é maior antes dos 45 anos.  As modalidades terapêuticas são cirurgia, embolização e radiocirurgia, ou combinações delas.

Fontes. 

Burger, PC, Scheithauer BW, Vogel FS.  Surgical Pathology of the Nervous System and its Coverings.  4th Ed. Churchill Livingstone, New York, 2002.   pp 403-7. 

Decker DA, Perry A, Yachnis AT.  Vascular and Ischemic Disorders. Chapter 24 in  Perry A, Brat DJ (eds). Practical Surgical Neuropathology. Churchill Livingstone Elsevier, 2010.  pp. 542-6.

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Resumo do caso, tomografias RM 28/5/09 RM 8/7/10
RM 27/7/11 Macro, sob lupa Masson
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Este assunto na graduação Cavernomas, mais casos :  neuroimagem, neuropatologia Texto : malformações vasculares do SNC: telangiectasias, cavernomas, MAVs. Características de imagem dos cavernomas
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