Neoplasias e outras lesões do SNC: 
características de imagem

 

Angiomas  cavernosos ou cavernomas.

São lesões vasculares pequenas, circunscritas, compostas por espaços vasculares sinusoidais de paredes muito finas, e muito próximos entre si, sem quantidade significativa de tecido nervoso entre eles. Apresentam hemorragias e trombos em várias fases de evolução. O cérebro adjacente fica impregnado por hemossiderina, tomando tonalidade ferruginosa. A organização dos trombos com formação de novos espaços vasculares leva ao aparente crescimento da malformação e a novos sangramentos. 

Localização – Cerca de 80% são supratentoriais, com preferência pelos lobos frontais e temporais. Localizações comuns são a substância branca profunda, junção córtex-substância branca e núcleos da base. Na fossa posterior, a ponte e hemisférios cerebelares. 

Incidência – ocorrem em 0,4% dos pacientes em séries de casos não selecionados.  São múltiplos em 50 % dos casos, chegando a 80% em casos familiares. Idade típica é 20 a 40 anos. 

Sintomas mais comuns –cefaléia, crises convulsivas, déficits neurológicos focais. 

Complicações. A principal é sangramentos repetidos. A taxa de sangramento franco é < 1% ao ano. 

Estudos de imagem

Angiografia. – A maioria não aparece na angiografia. 

TC – isodensos a moderadamente hiperdensos, comumente mostrando calcificações. A impregnação por contraste pode ser desde ausente a intensa. 

RM – mostra lesão bem delimitada com aspecto heterogêneo devido à coexistência de áreas com sinal variado, desde hiperintenso a ausente. Classicamente, mostram o chamado 'aspecto em pipoca', com lóbulos de hipersinal em meio a um fundo de hiposinal. O hipersinal em T1 e T2 se deve à metemoglobina de sangramentos ou trombos recentes, e a ausência de sinal em T2 se deve à hemossiderina ou ferritina oriundas de sangramentos mais antigos. 
 

 

Astrocitomas difusos de baixo grau.

TC (tomografia computadorizada).  Massa localizada ou difusa, hipodensa na tomografia sem contraste, e que não sofre impregnação com contraste. 

RM (ressonância magnética).  É hipointensa em T1 e discretamente hiperintensa em T2, sem impregnação pelo contraste paramagnético (gadolínio). Não há necrose. Pode haver degeneração cística. Há calcificações em 15 a 20% dos casos. Raramente, pode haver edema ou hemorragia. 

Glioblastoma multiforme. 

Como o tumor, as imagens também são  multiformes. 

  TC. Na TC sem contraste é uma lesão muito heterogênea, habitualmente com áreas centrais de baixa densidade, que refletem necrose ou formação de cistos (95% dos casos). Calcificação é rara. Hemorragia em diferentes estágios é freqüente. Há edema periférico, que circunda o tumor e se estende ao longo dos tratos de substância branca. O reforço após contraste é forte e heterogêneo, sendo comum um halo espesso de captação de contraste na periferia do tumor.  Gliomatose cerebral. Este termo é empregado quando não há massa tumoral predominante, mas infiltração difusa dos hemisférios cerebrais, sendo o reforço pós contraste leve ou ausente. 

  RM.    O aspecto também é heterogêneo. Em T1 observa-se massa de sinal misto, mal delineada, com formação de cistos ou necrose, e parede irregular espessa, com reforço marcante e heterogêneo após contraste. Como são tumores altamente vascularizados é possível observar-se 'flow void' (vasos com ausência de sinal) e hemorragias em diversos estágios.  Em T2 destaca-se também o aspecto heterogêneo, com áreas de hipo-, iso- e hipersinal. As áreas de necrose correspondem a hipersinal. As margens do tumor se confundem com o edema circunjacente, não sendo possível diferenciar edema de tumor. 

Astrocitoma  pilocítico

    TC. São tipicamente massas arredondadas ou ovais, bem demarcadas,  de bordas lisas, hipo- ou isodensas. São calcificados em 10% dos casos. Há sempre reforço pelo contraste, que é forte ou variável (heterogêneo). Algumas lesões se reforçam de forma sólida e homogênea, e outras têm nódulo mural que se reforça num grande cisto. 

    RM. Quando císticos, aparecem com iso ou hiposinal em T1, hipersinal em T2.  Nódulos murais e tumores sólidos aparecem como lesões isointensas em T1 e T2 que se reforçam com contraste de forma forte e heterogênea. 

Xantoastrocitoma  pleomórfico

    TC. Nos exames sem contraste, os xantoastrocitomas aparecem como massas hipodensas com componente cístico e margens bem definidas. Um nódulo mural isodenso que se impregna fortemente por contraste é característico. A lesão geralmente é superficial e faz contato com as leptomeninges. A localização mais comum é no lobo temporal e, em ordem decrescente de freqüência, nos lobos parietal, occipital e frontal. 

    RM. Massa bem delimitada parcialmente cística, hipo ou isointensa à substância cinzenta em T1. Um nódulo periférico está freqüentemente presente. Em T2 há hipersinal tanto do nódulo como do componente cístico. Há intenso reforço do nódulo por contraste. Diagnósticos diferenciais incluem o astrocitoma pilocítico e o ganglioglioma. 

Esclerose tuberosa e 
astrocitoma subependimário de células gigantes. 

Os túberes, ou tuberosidades corticais, são detectados por RM em cerca de 95 % dos pacientes com ET. Cerca de 80 % são identificados apenas por anormalidade de sinal, outros 20% causam deformação do giro afetado. Em crianças mais velhas e adultos, as lesões são iso- ou hipointensas em T1 e hiperintensas em T2. Impregnação por contraste é rara e não indica malignidade. Na TC aparecem como hipodensidade da medular do giro. A calcificação aumenta com a idade, sendo vista em 50% dos pacientes com mais de 10 anos. 

Nódulos ou hamartomas subependimários são encontrados em 95% dos pacientes com ET. Cerca de 2/3 localizam-se próximos ao núcleo caudado, ao longo do sulco talamoestriado dos ventrículos laterais, logo atrás do foramen de Monro. Menos comumente ocorrem no átrio ou no corno inferior dos ventrículos laterais. Em TC, estes nódulos aparecem bem devido às freqüentes calcificações.  Em RM geralmente são hipointensos em relação à substância branca em T2, também por causa das calcificações.  Os nódulos subependimários sofrem reforço após contraste em 30 a 80% dos casos, mas isto não indica neoplasia. 

Os astrocitomas subependimários de células gigantes ocorrem em cerca de 15% dos pacientes com ET.  A localização é quase sempre na região do foramen de Monro. Aparecem heterogêneos tanto em TC (áreas iso- e hipodensas, com calcificações) como em RM (intensidades mistas de sinal tanto em T1 como TR longo). Podem ser císticos, e reforçam-se com contraste de forma intensa mas heterogênea. Crescem lentamente e são de comportamento benigno, porém causam hidrocefalia obstrutiva. 

 

Oligodendrogliomas

Correspondem a 5-10% dos gliomas. Há uma forma pura, e uma forma mista, os oligoastrocitomas, que são mais comuns. Idade - tumores de adultos, com pico entre 35 e 45 anos. Localização mais freqüente - supratentorial na região frontal. Envolvem freqüentemente o córtex. Geralmente têm crescimento lento. 

TC(tomografia computadorizada).  Massa hemisférica parcialmente calcificada, heterogênea, que se estende perifericamente até o córtex. As calcificações são nodulares em 70 a 90% dos casos.  Pode haver degeneração cística. Hemorragias e edema perilesional são mais raros. Há impregnação leve a moderada por contraste. Como crescem lentamente, podem causar escavação localizada da tábua interna do crânio. 

RM (ressonância magnética).  Tumor heterogêneo,  hipo- ou isointenso em T1,  iso- ou hiperintenso em T2, com reforço irregular por contraste. É mais difícil observar as calcificações na RM, que se manifestam por ausência de sinal. 

As feições de imagem não permitem o diagnóstico entre oligodendroglioma puro e oligoastrocitoma. 

Ependimomas

Incidência. Correspondem a 2 a 8% dos tumores cerebrais, e a 15% das neoplasias da fossa posterior na infância. Éo terceiro tumor do SNC em freqüência na idade pediátrica. Ocorre principalmente em crianças de 1 a 5 anos, com um segundo pico em torno dos 30 anos. 
Localização. 60% infratentorial, 40% supratentorial. Na região infratentorial, mais de 90% estão situados no IVº ventrículo. Na região supratentorial, a localização é mais freqüentemente extraventricular (66- 75%) do que intraventricular. 

  TC.  Na TC sem contraste é uma lesão geralmente isodensa, com calcificação em 50% dos casos. Há impregnação leve a moderada em 70%. Hemorragia é rara. 

  RM.    O diagnóstico é feito mais pela localização e morfologia do que pelas alterações de sinal. O aspecto clássico é de uma massa lobulada, com iso- ou hiposinal ao córtex em T1, e iso- ou hiperintensa em T2. As porções císticas quando presentes são hiperintensas em relação ao líquor em T2, indicando conteúdo proteico. Quando no  IVº ventrículo, preenche-o, podendo sair pelos foramens de Luschka e preencher as cisternas adjacentes.  Caráter heterogêneo (áreas hipo-, iso- e hiperintensas) pode representar necrose, calcificação, vascularização tumoral ou produtos de degradação do sangue. O reforço ou impregnação após contraste é heterogêneo.  Os ependimomas supratentoriais são muitas vezes indistingüíveis de outras lesões apenas pelo aspecto em imagem. Como são freqüentemente extraventriculares, podem simular astrocitomas. 

Gangliogliomas

TC. Na TC, aparecem como nódulos bem delimitados, hipodensos, sólido-císticos, e freqüentemente calcificados. A calcificação é de observação mais fácil na TC que na RM, onde o cálcio dá ausência de sinal em T1 e T2. Pode haver impregnação variável pelo contraste iodado ou ausência de impregnação. Tumores em localização superficial podem causar erosão da tábua óssea interna, compatível com seu lento crescimento. 

RM.    Em RM, a lesão é geralmente de limites precisos, hipointensa em cortes pesados em T1 e hiperintensa em T2. Pode haver impregnação pelo gadolínio, indo de ausente a intensa, podendo apresentar padrão anular. 

Tumor neuroepitelial disembrioplásico (DNET)

A localização mais comum é no lobo temporal.  Em RM, lesão caracteristicamente focal, predominantemente restrita ao córtex, hidratada, hipointensa em T1, hiperintensa no TR longo. 
Na TC, pode ser iso- ou hipodensa, e mostrar calcificações. Em lesões superficiais, pode ser possível observar deformidade da tábua interna da calota craniana, um sinal do lento crescimento do tumor.  Cerca de 1/3 dos casos mostra impregnação por contraste, tanto em TC como RM. 
Não há edema peritumoral nem efeito de massa.  Contudo,  o diagnóstico diferencial com astrocitomas difusos de baixo grau ou com ganglioglioma não é possível só pelas características de imagem.

Tumor neuroectodérmico primitivo (PNET)

TC – Nos exames sem contraste, os PNETs mostram grande massa hemisférica compacta e heterogênea. São comuns hemorragias, necrose, calcificações e cistos. Há impregnação variável e heterogênea pelo contraste. 

RM -  Massa hemisférica heterogênea com sinal variável em T1 e T2. O grau de realce por contraste vai de leve a moderado. O contraste ajuda a detectar disseminação meníngea. 
 

Meduloblastoma 

Constituem 10 a 15% dos tumores cerebrais primários em crianças e  um terço das neoplasias pediátricas da fossa posterior. Incidência maior antes dos 15 anos, com predominância do sexo masculino. 

TC.  Tipicamente é uma massa vermiana (75%), aspecto piriforme ou arredondado, que desloca o IVº ventrículo. 25% ocorrem em regiões laterais. Um fino crescente de líquor pode às vezes ser identificado ao redor da lesão. São homogeneamente hiperdensos na TC sem contraste. Calcificações em 15% dos casos. Hemorragias são raras. Com contraste, há reforço moderado e homogêneo. Contudo, esta aparência típica é vista só em 30% dos casos. Outras feições são comuns: alterações císticas, 65%, isodensidade na TC sem contraste em 3% e ausência de impregnação em 3%.  Em crianças, 15 a 20% dos meduloblastomas estão situados fora da linha média. Em adultos a localização preferencial é fora da linha média. 

RM.  O tumor preenche o IVº ventrículo e se estende inferiormente pelo foramen de Magendie para a cisterna magna. Hidrocefalia é comum. É heterogeneamente hipointenso em relação à substância cinzenta em T1 , com cistos hiperintensos em T2 em 75 a 80% dos casos. A porção sólida da lesão varia de hipo a hiperintenso em T2. O reforço por contraste é variável. Impregnação moderada é típica. Muitos tumores mostram só reforço parcial. Em crianças mais velhas e adultos, os meduloblastomas são encontrados principalmente nos hemisférios cerebelares e com freqüentes  alterações císticas. As margens do tumor são menos bem definidas, e alguns podem assemelhar-se ao meningioma. Em 50% dos casos há disseminação liquórica. Em 5% pode haver disseminação extracraniana, principalmente para osso. São metástases líticas, mas podem também ser osteoblásticas. Disseminação meníngea já está presente na fase inicial dos sintomas em 10 a 50% dos casos. Aparecem na TC e RM como focos lineares de reforço (em T1 com contraste) nas cisternas e sulcos. O método de escolha para detecção é a RM  em T1 com contraste. É superior a RM sem contraste, TC, mielografia e mielotomografia. 

Meningioma 

TC: Em  70 - 75 % dos casos o tumor é hiperdenso. São feições comuns: calcificação (20-25%), áreas císticas (10 - 20 %) e edema perilesional (60 %). Na grande maioria (> 90%) há reforço forte e uniforme por contraste iodado.  Hemorragia é rara. 

RM:O tumor é isointenso com a substância branca. É discretamente hipointenso em T1 e hiperintenso em T2 em relação ao córtex. Em 95% há reforço (impregnação) forte com contraste. Há fenda liquórica ou vascular ao redor da imagem. Em 60% observa-se a chamada cauda dural (trata-se de alteração reacional da dura, não infiltração pelo tumor). 

Localização dos meningiomas: 25% parasagital, 20% na convexidade,  15 a 20% na borda esfenoidal, 5 a 10% na goteira do olfatório, 5 a 10% paraselar, 10% na fossa posterior ao longo do clivus (próximo ao poro acústico), 2% em outras localizações, como intraventricular, região pineal e baínha do nervo óptico, e 1% extracraniano  (nariz, seios da face).

Hemangioblastomas

 TC.  Lesão de aparência cística, hipodensa, com nódulo mural isodenso, que pode ser difícil de identificar nos estudos sem contraste. Com contraste, há forte captação no nódulo. A localização mais comum é no cerebelo. O nódulo está junto à superfície pial da lesão em 70 a 75% dos casos. 

RM.   O componente cístico é hipointenso em T1, hiperintenso em T2. O nódulo mural é geralmente heterogêneo, isointenso em T1 e hiperintenso em T2, com intensa impregnação pelo gadolínio. Vasos serpiginosos com vazio de fluxo (flow void) podem ser observados com freqüência. 

Angiografia.  Mostra habitualmente grande massa avascular na fossa posterior com pequeno nódulo mural altamente vascularizado. O realce pelo contraste é intenso e prolongado. Às vezes observam-se  veias de drenagem precoce. 
 

Metástases

Metástases constituem de 25 a 33% de todas as lesões tumorais cerebrais.  80% são múltiplas. São mais freqüentes em idosos. Locais comuns são no crânio (na calota, especialmente dos tumores de pulmão e mama),  no parênquima (que é o sítio preferencial,  principalmente na junção entre substância branca e cinzenta), e nas leptomeninges. Menos habitualmente são vistas na dura-máter e em placas piais ou subpiais. Raramente, há a encefalite carcinomatosa e a encefalite límbica, esta última uma doença paraneoplásica. 

No crânio, podem-se observar desde pequenas metástases diplóicas até grandes áreas de destruição óssea. Metástases ósseas muitas vezes envolvem também a dura-máter. Metástases leptomeníngeas são menos comuns que as parenquimatosas. O espaço subaracnóideo pode ser difusamente envolvido, comprometendo principalmente as cisternas basais. 

Tumores de origem de metástases ao SNC em ordem decrescente: pulmão, mama, melanoma, tumores gastrointestinais e gênito-urinários. 

TC. Sem contraste, mostram-se como massas iso- ou hiperdensas. Raramente calcificam.  Com contraste, têm reforço sólido ou anular. É característico que apresentem acentuado edema ao redor. 

RM.  São hipointensas em T1 e iso- ou hiperintensas em T2. Reforçam-se moderada a intensamente com contraste.  Em geral apresentam grande edema ao seu redor. Pulmão e mama são origem comum de metástases císticas ou necróticas.  Pode haver hemorragia em diferentes estágios, sendo mais comuns no melanoma. 
 

Craniofaringiomas

Ocorrem exclusivamente na região da sela, cisterna supraselar e do IIIº ventrículo. Correspondem a 3% de todos os tumores intracranianos. São hormonalmente inativos. Têm distribuição etária bimodal, sendo a primeira moda na infância e adolescência (pico entre 5 e 10 anos), correspondendo à forma adamantinomatosa, e um segundo pico na 6ª década correspondendo à forma escamopapilar.  Infreqüentemente estão apenas dentro da sela ou do IIIº ventrículo. Geralmente ocupam mais de uma localização. Os sintomas e sinais mais comuns devem-se à hipertensão intracraniana, distúrbios visuais, e alterações hormonais devidas à lesão do hipotálamo e hipófise.  As característica de imagem abaixo são as da forma adamantinomatosa. 

TC. Geralmente imagens sólido-císticas, com predomínio do componente cístico. O conteúdo do cisto varia em densidade. Calcificações ocorrem na maioria dos casos, na periferia do cisto e na área sólida. Fibrose e reação inflamatória na periferia do tumor são responsáveis pelas áreas de impregnação pelo contraste. 

RM. Massas heterogêneas, com componente cístico que é hiperintenso em T1 e T2, devido ao conteúdo espesso, rico em lípides (portanto, macromoléculas) e que pode conter sangue. O tumor engloba os grandes vasos da base cerebral. A porção sólida é geralmente calcificada, representando um componente mais heterogêneo, com focos de hiposinal. Há moderado grau de realce da porção sólida por contraste. 

A forma escamopapilar, encontrada no adulto, tende a ser mais sólida, encapsulada, sem calcificação, e geralmente dentro do IIIº ventrículo. Não tem a hiperintensidade característica da forma adamantinomatosa. Há impregnação do componente sólido por contraste. 

Craniofaringiomas - complemento

Resumo do artigo de 

Schenka AA e Zanardi VA:  Craniofaringiomas: aspectos clínico-radiológicos. Radiol Bras 33:253-61, 2000.

O termo ‘craniofaringioma’ foi introduzido por Cushing em 1923.  É uma lesão tumoral complexa de natureza benigna, mas localmente agressiva. Pode originar-se de metaplasia de células adenohipofisárias, ou de células escamosas embrionárias, constituintes de um ducto faringo-hipofisário parcialmente involuído. Pode ocorrer em localização intraselar ou supraselar. 

O craniofaringioma  representa 3-4% dos tumores intracranianos primários na população geral e 5 a 10% em crianças. Neste grupo é considerado a neoplasia intracraniana não-neuroepitelial mais freqüente.  Embora seja classicamente descrito como um tumor da infância e adolescência, há mais casos de craniofaringioma em adultos (59%) que em crianças (42%). Cerca de 40% dos casos são diagnosticados entre 6 e 10 anos de idade. Não há preferência por sexo. Os dois tipos histológicos de craniofaringioma (adamantinomatoso e escamopapilar), que não mostram diferenças quanto ao prognóstico. O principal fator prognóstico em relação à recidiva é a extensão da ressecção cirúrgica, que, por sua vez, depende do tamanho e topografia do tumor (ver adiante). Lesões > 5 cm, ditos craniofaringiomas gigantes, e lesões incompletamente ressecadas têm maior taxa de recidiva. 

O presente estudo foi baseado em 14 casos de craniofaringioma : 11 crianças ou adolescentes (< 18 anos) e 3 adultos. Idade variou de 3 a 39 anos, com média de 13,5 anos. Havia 12 pacientes masculinos e 2 femininos, 11 brancos e 3 negros. 

Clínica. Os sinais e sintomas de apresentação foram classificados em 3 grupos: visual, endócrino e neurológico. 

  • Distúrbios visuais em 12/14 casos: diminuição da acuidade (57%), papiledema (57%), estrabismo (28%). 
  • Alterações endócrinas em 6/14 casos (mais freqüentes em crianças): déficit de crescimento (28%), hipogonadismo (atraso puberal ou regressão de caracteres sexuais secundários,  21%), diabetes insipidus (21%). 
  • Manifestações neurológicas – 100% dos casos: cefaléia (85%), hipertensão intracraniana (57%), crises epilépticas (43%) e déficits motores (28%). 


Neuroimagem

  • Localização.  A maioria dos tumores possuia pelo menos componente intra-selar (71%) e pré-quiasmático (42%). Todos tumores apresentavam componente supra-selar, a principal forma de extensão. Não foram encontrados tumores puramente selares ou supra-selares. 
  • Tamanho.  A maioria dos tumores (57%) tinha tamanho médio; formas gigantes (> 6 cm) em 2 casos (14%). As dimensões médias foram 4 x 3,5 x 3,4 cm. 
  • Morfologia. Os tumores foram classificados em sólidos, císticos e mistos, estes os mais freqüentes com 64%. Em 3 casos não havia calcificações. Nos outros 11 casos as calcificações eram exclusivamente grosseiras (35%), exclusivamente periféricas ou curvilíneas (21%) e mistas (21%). 


Revisão da literatura

Forma, dimensões, composição Podem adotar várias formas, desde nódulos pequenos, esféricos, sólidos e bem circunscritos, a massas irregulares, multilobuladas, com cistos multiloculados. O diâmetro médio é de aprox. 3 cm. O tumor tende a ser maior em crianças e as formas gigantes (> 6 cm) são mais freqüentes neste grupo. 
A composição é variável. Os tumores podem ser sólidos,  císticos, calcificados, ou com aparência mista. As porções sólidas mais comumente se desenvolvem póstero- lateralmente. O componente cístico pode ser encontrado sobre ou ao redor da porção sólida e é responsável pelas extensões anteriores. Os cistos podem ser multiloculados. Pode ser encontrado nível fluido-fluido intracístico, que representa diferentes componentes: debris epiteliais, produtos da degeneração do sangue, proteínas (cerca de 6%) e colesterol (geralmente não ultrapassa 0,07%). 

Clínica.  Os principais sintomas são hipertensão intracraniana (60-75%) e distúrbios visuais (50%). Em idosos, 50% têm distúrbios cognitivos (de déficit de memória a demência). 

Neuroimagem

Na radiografia simples de crânio, metade das crianças e ¼ dos adultos apresentam alargamento da sela turca. A integridade do dorso da sela deve ser sempre conferida. Uma vez perdida, fornece evidência de extensão tumoral. 

A tomografia computadorizada (TC) (cortes coronais sem contraste) é o melhor meio para identificar as calcificações e erosões ósseas.  Os tumores císticos apresentam atenuação diminuída (aspecto hipodenso) devido ao conteúdo lipídico. Só raramente aparecem iso- ou hiperdensos. Quando isso ocorre pode dever-se a alta concentração de proteína (> 90 g/l) e/ou de metemoglobina livre. A metemoglobina é também responsável pelo aspecto macroscópico em óleo de motor do líquido do cisto.  O contraste é captado homogeneamente pela porção sólida do tumor e pela cápsula do cisto. 

A ressonância magnética (RM) é valiosa especialmente para visualizar o quiasma óptico, invasão dos seios cavernosos e a interface tumor-cérebro. Estudo sagital em T2 feito com fast spin echo permite melhor avaliação do componente cístico. A RM tem como vantagens: 

  • a) ausência de artefatos produzidos pelo tecido ósseo (strikes); 
  • b) imagens diretas no plano sagital; 
  • c) maior definição anatômica; 
  • d) estudos angiográficos sem contraste (angioressonância). 
O componente sólido e, geralmente, a cápsula apresentam captação de contraste tanto na TC como na RM. 

As calcificações são mais comuns em crianças (95% dos casos). São melhor demonstradas por radiografias simples e TC. Em RM, calcificações finas são de difícil identificação; calcificações grosseiras podem aparecer como ausência de sinal. Em crianças, outras causas de calcificações na região selar são raras. Em adultos, deve-se considerar no diagnóstico diferencial os gliomas, meningiomas, colesteatomas (cistos epidérmicos), pinealomas ectópicos, adenomas da hipófise, aneurismas, e lesões inflamatórias como tuberculomas. 

No seguimento, aconselha-se uma RM com contraste até 48 horas após a cirurgia para avaliar se restou tumor, antes que ocorra a reação meníngea resultante do trauma cirúrgico. Antes da alta hospitalar, uma TC nos planos axial e coronal para detectar calcificações ou tumor residual. Se não houver suspeita de recidiva, faz-se TC e RM com contraste após 6 meses. 

Topografia

Em crianças, os craniofaringiomas são predominantemente supra-selares. Em adultos, envolvem mais comumente a região retroclival, crescendo acima do dorso da sela em direção à cisterna interpeduncular. Formas puramente intraselares ocorrem em 5-15% dos casos, as intra e supra-selares em 30% e as supra-selares em 46 a 95%.  Podem estender-se anteriormente em 30% dos casos, para fossa média em 25% e posteriormente (retroclival, ângulo ponto-cerebelar ou foramen magno) em menos de 6%. Tumores puramente intraventriculares ou extensões através do osso esfenóide são raros. 
Hidrocefalia pode resultar de invasão do IIIº ventrículo, oclusão dos foramens de Monro, ou deslocamento posterior do aqueduto juntamente com os pedúnculos cerebrais. A hidrocefalia desloca e coloca sob tensão os vasos cerebrais. 

Prognóstico

Na forma intra-selar, o tumor localiza-se totalmente dentro da sela, o que pode causar seu alargamento, destruição parcial ou total do processo clinóide e extensão para o seio esfenoidal e seios cavernosos. Porções significativas da hipófise podem ainda estar intactas, justificando todo esforço em identificá-las e preservá-las na cirurgia. A morbidade e mortalidade pós-cirúrgicas nas formas intraselares são baixas.

Os tumores pré-quiasmáticos causam elevação do quiasma óptico, e dos segmentos A1 e ramos frontais proximais das Aa. cerebrais anteriores. Diferentemente dos gliomas quiasmáticos ou hipotalâmicos, os craniofaringiomas apenas deslocam estes vasos, raramente ocluindo-os ou envolvendo-os. As Aa. carótidas internas usualmente estão deslocadas lateralmente. Freqüentemente o tumor oblitera a cisterna pré-quiasmática, crescendo anterior e superiormente ao quiasma. Isto desloca o quiasma para cima e para trás e tensiona e verticaliza ambos os nervos ópticos. O recesso pré-óptico do IIIº ventrículo é obliterado e a lâmina terminal é também deslocada para cima e para trás. Contudo, a morbidade e mortalidade pós-cirúrgicas nas formas pré-quiasmáticas, como nas intraselares, são baixas. 

Os tumores pós-quiasmáticos estendem-se entre o quiasma e os tratos ópticos, e aderem ao hipotálamo e IIIº ventrículo. Também deslocam posteriormente a A. basilar, e as Aa. comunicantes posteriores, tornando-as arqueadas. Esses tumores são os de remoção mais difícil. 

Formas gigantes (> 6 cm) também têm alta morbidade e mortalidade pós-cirúrgicas. 

Mesmo quando a ressecção total não é possível, remoção parcial e derivação liquórica, podem resultar em grande melhora clínica e períodos de remissão prolongados. 

Cistos epidérmicos

Cistos epidérmicos e dermóides são melhor classificados como lesões não neoplásicas tumor-símiles.  Correspondem a 0,2 a 1% dos tumores intracranianos primários. Ocorrem entre 20 e 60 anos, com pico na 4ª década. 

Os cistos epidérmicos ou tumores epidermóides podem ser congênitos ou adquiridos. 

Os congênitos provavelmente se originam por inclusão de elementos epiteliais ectodérmicos na época do fechamento do tubo neural ou da formação das vesículas cerebrais secundárias.  Os adquiridos são secundários a trauma, por implantação de epiderme em tecidos profundos. São incomuns na cavidade craniana, sendo mais encontrados na coluna lumbosacra após punções com agulha sem mandril. 

Localização. Na grande maioria situam-se nos espaços subaracnóideos basais, 40 – 50% no ângulo ponto-cerebelar. É o 3º tumor mais comum nesta localização depois dos schwannomas e meningiomas.  Vêm depois as regiões selar e paraselar (seio cavernoso, fossa craniana média, 7% cada). Os tumores intraaxiais são raros, sendo o IVº ventrículo a localização mais comum.  Cerca de 10% dos cistos epidérmicos são extradurais, situados na díploe dos ossos da convexidade, raramente no esfenóide. 

Os cistos epidérmicos intracranianos são lesões císticas bem delimitadas, que se insinuam ao longo das cisternas liquóricas. Têm superfície externa irregular lobulada e aparência de madrepérola. O conteúdo é esbranquiçado e floconoso, correspondendo a lamelas de queratina descamada a partir do epitélio que circunda o cisto. Crescem englobando vasos e nervos e se insinuando no cérebro adjacente. 

Microscopicamente, o epitélio do cisto é do tipo escamoso pluriestratificado e não possui anexos como glândulas ou folículos pilosos. Já os cistos dermóides caracterizam-se por possuir tais anexos.  O epitélio do cisto prolifera a taxa semelhante que a epiderme normal.  Embora sejam lesões histologicamente benignas, a localização basal e a dificuldade de ressecção completa tornam a recidiva local comum. 

Características de Imagem. 

Radiografias simples. – Os cistos diplóicos podem produzir erosões ósseas focais com margens escleróticas. 

TC.  Os cistos epidérmicos consistem de massas lobuladas bem delimitadas, com atenuação semelhante à do líquor (ou seja, hipodensos). Há calcificações em 10 – 25% dos casos. Podem às vezes aparecer hiperdensos na TC sem contraste devido a hemorragias, alto conteúdo protéico ou saponificação do conteúdo do cisto com cálcio. 
Com contraste, pode haver reforço da cápsula do cisto. 

RM.  As características de sinal são semelhantes às do líquor. A porção central é habitualmente hipointensa em T1, hiperintensa em T2 e FLAIR. Há casos em que o conteúdo é mais hiperintenso em T1, indicando maior conteúdo em macromoléculas.  A borda lobulada é levemente mais intensa em T1 que o conteúdo. São características as digitações na periferia do cisto, que penetram no tecido nervoso. É esta feição que torna a ressecção cirúrgica completa muito difícil. 
 

Adenomas da hipófise

Adenomas hipofisários respondem por cerca de 10% das neoplasias intracranianas primárias e 1/3 a 1/2 dos tumores da região selar. 

Anatomia microscópica da adenohipófise.   As várias células produtoras de hormônios não estão distribuídas homogeneamente. 

  • As células produtoras de ACTH e TSH são PAS +, basófilas em HE,  e estão concentradas na linha média. 
  • As células produtoras de prolactina são geralmente cromófobas e as de GH são acidófilas. Ambas predominam nas regiões laterais. 
  • As células produtoras de FSH e LH estão difusamente distribuídas. 
A altura máxima normal da hipófise é 
  • 6 mm para crianças, 
  • 8 mm para homens adultos, 
  • 10 mm para mulheres em idade fértil, e 
  • 12 mm para mulheres em gravidez avançada ou puerpério. 


Os microadenomas são definidos como de diâmetro < 10 mm.  Estudos microscópicos de hipófises de autópsia mostram microadenomas incidentais em 8 a 27% dos casos, sendo múltiplos em 9%. Isso torna os microadenomas cerca de 400 vezes mais comuns que os macroadenomas.  Já estudos com imagem mostram os macroadenomas como duas vezes mais comuns que os microadenomas (estes na grande parte pequenos demais para detecção). 

Os adenomas endocrinamente ativos correspondem a 75% dos casos. 

  • Prolactinomas são os mais comuns (30%), predominam no sexo feminino 4-5:1, tipicamente em adultos jovens. Pelo menos metade são microadenomas. Níveis séricos de prolactina > 150 ng/ml são indicativos de tumor. Em mulheres produzem amenorréia e galactorréia. Em homens são geralmente silenciosos do ponto de vista endócrino, e podem atingir grandes tamanhos, estando associados a altos níveis séricos de PRL.
  • Adenomas produtores de GH (15%) predominam no sexo masculino 2:1, ocorrendo freqüentemente em crianças, em que produzem gigantismo; em adultos, causam acromegalia. 
  • Adenomas produtores de ACTH (5-10%) predominam em mulheres, 22% em crianças ou adolescentes. Podem produzir síndrome de Cushing mesmo quando muito pequenos. 
  • Adenomas gonadotróficos  (5-10%) secretam FSH e LH, produzindo distúrbios menstruais ou infertilidade em mulheres, e são assintomáticos no sexo masculino. 
  • Adenomas tireotróficos são raros (1-4%). 
  • Adenomas que secretam mais de um hormônio (mistos) respondem por 2,5 a 8% dos casos,  sendo que os mais comuns produzem prolactina e GH. 
Adenomas endocrinamente silentes (‘null cell’) podem secretar subunidades ou fragmentos de hormônios sem efeito endócrino. Podem atingir grande tamanho causando sintomas por efeito de massa e levando a alterações visuais e panhipopituitarismo. 

Os macroadenomas fazem protrusão para cima, estendendo-se através do diafragma da sela para a cisterna supraselar. Podem tomar aspecto em ampulheta. Extensão para os seios cavernosos é comum, assim como a formação de hemorragias e cistos nos tumores maiores. 

TC.   Macroadenomas são na maioria isodensos, mostrando moderado reforço com contraste. Calcificações são raras (1-8%).  Necrose, hemorragia e formação de cistos podem dar aspecto heterogêneo à lesão. 

RM.   Macroadenomas não complicados são isointensos à substância cinzenta em todas as seqüências. Necrose, hemorragia e formação de cistos podem dar aspecto heterogêneo. O reforço por contraste é intenso e geralmente heterogêneo. Invasão do seio cavernoso é mais freqüente em prolactinomas e adenomas secretores de GH.  RM é usada para monitorar a terapia com bromocriptina. A redução de tamanho é significativa já uma semana após o início do tratamento. 

Principal fonte:  Osborn AG.: Diagnóstico Neuroradiológico.  Livraria e Editora RevinteR, Ltda, Rio de Janeiro, 1999. 

 
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