Comentário.
Este curioso
e raro exemplo de tumor infiltrativo do sistema nervoso foi classificado
por nós como astrocitoma pilocítico por causa da sua localização
primária cerebelar (no vermis superior) e padrão histológico
protoplasmático com degeneração microcística.
Contudo, ao contrário dos astrocitomas pilocíticos habituais
no cerebelo (que têm lento crescimento e bom prognóstico),
este tumor se comportou de forma excepcional, invadindo extensamente as
leptomeninges e parênquima limítrofes, chegando a disseminar-se
por todas as cisternas em torno do tronco cerebral e a apresentar infiltração
parenquimatosa infra- e supratentorial.
Apesar da
agressividade, o ritmo de crescimento foi lento, como documentado por RMs
no espaço de 2 anos. O aspecto histológico do tumor
não faria supor um comportamento agressivo. As células tinham
núcleos com escassas atipias, havia regularidade no aspecto geral
da neoplasia, não se observavam necrose nem figuras de mitose. O
índice de marcação por Ki-67 foi muito menor do que
o habitual em gliomas supratentoriais de alto grau, como o glioblastoma
multiforme. A maior marcação foi justamente no componente
vascular. Proliferação capilar em astrocitomas pilocíticos
já foi observada por nós em vários outros casos, inclusive
com marcação alta por Ki-67. É um fenômeno bem
conhecido na literatura e em si não deve ser interpretado como evidência
de malignidade, ao contrário do que ocorre nos astrocitomas difusos,
onde conta como um dos critérios de malignidade na classificação
da OMS.
Em astrocitomas
pilocíticos, Giannini et al. (1999) não encontraram correlação
do tempo de sobrevida com qualquer padrão histológico, inclusive
com o índice de marcação por MIB1 (=Ki-67). Já
nos astrocitomas difusos, houve boa correlação do índice
de marcação por MIB1 com o grau do tumor, atividade mitótica
e tempo de sobrevida.
Hukin et
al. (2002) encontraram uma freqüência de 7% para disseminação
leptomeníngea de tumores cerebrais de baixo grau em crianças,
mas a consideraram provavelmente uma subestimativa. A patogênese
da disseminação meníngea não ficou clara. Não
encontraram evidências histológicas sugestivas de que estes
tumores se comportariam diferentemente da grande maioria, em que
a doença é localizada. As diferenças podem dever-se
a expressão de fatores de crescimento ou moléculas de adesão
ainda não definidos.
Leung et
al. (1997) reconheceram que importantes diferenças entre o astrocitoma
pilocítico (grau I) e o astrocitoma fibrilar (grau II) são
a proliferação vascular e a grande propensão à
formação de cistos no astrocitoma pilocítico.
Para estudar a patogênese desta diferença, examinaram a expressão
de VEGF (fator de crescimento para endotélio vascular) e seus receptores
KDR e Flt-1 usando hibridização in situ.
Em 14 casos de astrocitoma pilocítico, demonstraram altos níveis
de VEGF em todos, especialmente na parede de cistos tumorais, em áreas
de degeneração cística hialina, e em astrócitos
reticulados estrelados em torno dos microcistos. KDR e Flt-1 foram expressados
nos vasos do tumor, com níveis particularmente altos em vasos jovens
e tortuosos, especialmente nas paredes dos cistos. Concluiram que
há alças parácrinas com secreção de
VEGF pelas células tumorais e proliferação das células
endoteliais que expressam receptores para este fator. Como o VEGF também
aumenta muito a permeabilidade do endotélio, sendo 50000 vezes mais
potente que a histamina, este aumento de permeabilidade levaria a extravasamento
de fluido com formação dos microcistos, que confluem nos
cistos macroscópicos, característicos do astrocitoma pilocítico.
Já
Pietsch et al. (1997) observaram que 44% dos astrocitomas pilocíticos
foram imunorreativos para VEGF, mas em vários casos havia proliferação
vascular pronunciada na ausência de VEGF.
Referências.
-
Giannini C.
et al. Cellular proliferation in pilocytic and diffuse astrocytomas.
J. Neuropathol Exp Neurol 58:46-53, 1999.
-
Hukin J et
al. Leptomeningeal dissemination in children with progressive low-grade
neuroepithelial tumors. Neuro-Oncology 4: 253-60, 2002.
-
Leung SY et
al. Expression of vascular endothelial growth factor and its receptors
in pilocytic astrocytoma Am J Surg Pathol. 21:941-50, 1997.
-
Pietsch T.
et al. Expression and distribution of vascular endothelial growth
factor protein in human brain tumors. Acta Neuropathol (Berl) 93:109-17,
1997.
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