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Ganglioglioma
com componente glial pilocítico.
Este curioso tumor de cerebelo, à primeira vista, poderia passar
facilmente como um astrocitoma pilocítico, comum nesta região
do sistema nervoso central. Apresenta os dois componentes habituais nos
astrocitomas pilocíticos, quais sejam, o padrão pilocítico
propriamente dito, e o padrão protoplasmático com degeneração
microcística. Foi o encontro de neurônios neste último,
documentados também com imunohistoquímica,
que estabeleceu o diagnóstico de ganglioglioma. Do ponto de
vista prognóstico, o tumor comporta-se como um astrocitoma pilocítico,
bem delimitado, com bom plano de clivagem, permitindo antecipar evolução
pós-cirúrgica favorável.
Comparar com_ outro caso de ganglioglioma, também de cerebelo, também extremamente bem delimitado, inclusive com fina cápsula fibrosa, em que o componente astrocitário do tumor era fibrilar, não pilocítico. |
Destaques da microscopia. | ||
Padrão pilocítico. Células com abundantes prolongamentos paralelos, densamente fibrilares, com fibras de Rosenthal e corpos hialinos | Padrão protoplasmático. Células com escassos prolongamentos em arranjo frouxo, com microcistos de permeio | Neurônios. Pequena percentagem das células têm aspecto de neurônios, com núcleo redondo, cromatina frouxa, nucléolo evidente e citoplasma basófilo, com corpúsculos de Nissl |
Atipias, multinucleação. Muitas células com núcleos aberrantes, hipercromáticos e/ou múltiplos, alguns dispostos em coroa | Vasos hialinizados, tortuosos,com paredes espessas e luz irregular | Siderocalcinose. Deposição de sais de cálcio e ferro nas paredes espessas de pequenos vasos, sugere hemorragias crônicas. Ver Perls para ferro, von Kossa para cálcio |
Hemossiderose. Grânulos de hemossiderina em macrófagos, ou livres no tecido, resultado de sangramentos anteriores dos vasos patológicos | Cisto intratumoral hemorrágico. Parede de cisto macroscópico, de conteúdo hemático. | Córtex cerebelar limítrofe. Parte de morfologia normal, parte com atrofia por compressão. |
Áreas pilocíticas, que constituiam a menor parte do tumor, são indistinguíveis de um astrocitoma pilocítico, ou de uma gliose pilocítica associada a lesões crônicas como craniofaringiomas. Os astrócitos constituintes são afilados, com longos prolongamentos eosinófilos levemente ondulados em paralelo, como uma cabeleira. É típico o encontro de corpos hialinos ou hialino-granulosos e fibras de Rosenthal. Para estas inclusões em microscopia eletrônica, clique : Rosenthal, corpos hialinos. |
Corpos hialinos, hialino-granulosos. Vários exemplos destas inclusões eosinófilas e refringentes de origem intraastrocitária são vistos aparentemente soltas no tecido. As gotas mais redondas, homogêneas e uniformes constituem os corpos hialinos. As que parecem aglomerados de pequenas subunidades são chamadas corpos hialino-granulosos. Provavelmente ambas são da mesma natureza que as fibras de Rosenthal, constituídas pela proteína alfa B-cristalina, uma proteína de choque térmico de baixo peso molecular, que é sintetizada por astrócitos reativos. Ver microscopia eletrônica deste caso. | |
Áreas protoplasmáticas com degeneração microcística. Este outro padrão, que constituia a maior parte do tumor, difere consideravelmente do anterior (pilocítico clássico), por sua textura frouxa, células estreladas de prolongamentos curtos, deixando entre elas espaços vazios (microcistos). Estes podem conter material amorfo, róseo ou arroxeado, possivelmente sintetizado pelas próprias células. Chamam a atenção também o pleomorfismo nuclear e a multinucleação, embora essas atipias não tenham implicação de pior prognóstico (ver Ki-67). Não raro, as células neoplásicas assemelham-se a oligodendrócitos, devido aos halos claros perinucleares. Nestas áreas foram encontrados neurônios, que definiram a neoplasia como ganglioglioma. |
Neurônios. Destacam-se pelo núcleo arredondado, com nucléolo conspícuo e fortemente basófilo, cromatina frouxa, citoplasma de limites nítidos, com áreas mais basófilas que corresponderiam a corpúsculos de Nissl mal individualizados (retículo endoplasmático rugoso). A natureza neuronal das células foi confirmada em imunohistoquímica por positividade citoplasmática para neurofilamento (NF), sinaptofisina (SNF) e cromogranina. | |
Seriam
estes neurônios pré-existentes?
É sempre necessário considerar a hipótese de que os
neurônios encontrados não sejam do próprio tumor, mas
remanescentes do tecido normal, e que teriam sido envolvidos pela infiltração
neoplásica. No presente caso consideramos esta hipótese altamente
improvável porque:
a) Os neurônios são irregulares, atípicos, com morfologia variável e aberrante e não lembram tipos celulares normais do cerebelo, como células em cesto, células de Purkinje, células granulosas, de Golgi ou do núcleo denteado. Para córtex cerebelar normal em HE, LFB-Nissl, imunohistoquímica para glia e neurônios, clique. b) As células estão dispersas irregularmente em tecido tumoral de padrão astrocitário protoplasmático, sem orientação definida e sem reproduzir a arquitetura normal do cerebelo. c) A neoplasia é expansiva, não infiltrativa, a julgar pela boa delimitação, que possibilitou a excisão cirúrgica em bloco, e pela preservação do córtex cerebelar em volta, que mostra apenas atrofia por compressão. Resposta: Muito provavelmente não. |
Atipias, multinucleação. Várias células são atípicas, multinucleadas, por vezes com núcleos dispostos em coroa na periferia. O pleomorfismo celular não é por si só sinal de mau prognóstico nos astrocitomas pilocíticos. Para exemplo com atipias excepcionalmente marcadas, clique. Para Ki-67 deste caso, com marcação de escassos núcleos, clique. | |
Vasos hialinizados. Vasos dilatados e tortuosos, com parede espessada, fibrosa e hialina, eram uma feição notável deste ganglioglioma. Muitos astrocitomas pilocíticos apresentam alterações vasculares análogas. Apesar da considerável deposição de colágeno na parede (ver tricrômico de Masson), a celularidade dos vasos é baixa, e não se nota proliferação ou empilhamento das células endoteliais. |
Siderocalcinose de pequenos vasos. Nas regiões periféricas da neoplasia, especialmente nas áreas pilocíticas, notava-se uma transformação peculiar dos pequenos vasos, conhecida como siderocalcinose. Trata-se da impregnação das paredes vasculares por sais de calcio e ferro, demonstráveis respectivamente pelas técnicas de von Kossa e Perls. Os pequenos vasos ficam fortemente basófilos e acelulares em HE, com morfologia alterada, por vezes retilínea, lembrando pequenos gravetos. Tem-se a impressão de se tornaram rígidos e quebradiços. Alguns apresentam várias luzes. |
Siderocalcinose é encontrada nas vizinhanças de focos crônicos de sangramento, como no presente caso, com vasos hialinizados e deposição de hemossiderina no tecido. Também é observada em núcleos da base, região hipocampal e região central do cerebelo, junto aos núcleos denteados, em pacientes idosos. Para um exemplo em caso da doença de Creutzfeldt-Jakob, clique. Intensa deposição de cálcio nos núcleos da base é também encontrada na doença de Fahr. | |
Hemossiderose peritumoral. Especialmente na periferia do tumor, notavam-se depósitos de hemossiderina na forma de grãos de pigmento marrom escuro. A hemossiderina deriva de hemorragias crônicas, com catabolismo das hemácias fagocitadas por macrófagos. O excesso de ferro no citoplasma dos macrófagos leva à saturação da ferritina, uma molécula envolvida no transporte e armazenamento do ferro (ver texto de apoio do curso de graduação). As moléculas de ferritina saturadas coalescem em grânulos de hemossiderina. O ferro com valência 3 é demonstrável pela reação de Perls. Hemossiderina é notada em ressonância magnética em seqüências com TR (tempo de repetição) longo como T2, FLAIR e DP (densidade de prótons), como áreas de ausência de sinal (que aparecem em preto). | |
HE. Grânulos de hemossiderina aparecem de marrom escuro a amarelo dourado e são refringentes (seu brilho muda abaixando o condensador ou fechando o diafragma do condensador). | Perls. Técnica histoquímica para demonstrar hemossiderina no tecido. Na foto, um macrófago contendo hemossiderina no citoplasma, que aparece em azul marinho, quase negro. Para mais sobre este procedimento, clique. |
Cisto tumoral hemorrágico. Parede do cisto intratumoral macroscopicamente preenchido por sangue era constituída por tecido neoplásico glial, com atipias nucleares e fibras de Rosenthal. Não havia células endoteliais de revestimento, afastando uma estrutura vascular. Nesta área não foram encontrados neurônios. |
A parede do cisto era formada por tecido neoplásico de padrão pilocítico, densamente fibrilar, contendo fibras de Rosenthal. Alguns núcleos celulares eram altamente atípicos, como já demonstrado em outras áreas do tumor. | |
Córtex cerebelar junto ao tumor. A margem do tumor era nítida e tocava no córtex cerebelar, com bom plano de clivagem, sem infiltrar. O córtex estava atrófico em certas áreas e normal em outras, dependendo, respectivamente, se houvesse ou não compressão pelo tumor. |
Caso do Serviço de Neurocirurgia do Hospital Centro Médico de Campinas, gentilmente contribuído pelos Drs. Antonio Augusto Roth Vargas, Marcelo Senna Xavier de Lima, Paulo Roland Kaleff e residentes. Campinas, SP. |
Para mais imagens deste caso: | RM | Macro |
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