Hemorragias  cerebrais

 
Há basicamente dois tipos de hemorragia intracraniana espontânea, ambas comuns e graves:
a) hemorragias intracerebrais e b) hemorragias subaracnóideas.

As hemorragias intracerebrais mais comuns são devidas à hipertensão arterial sistêmica essencial.

Menos freqüentemente, podem resultar de malformações vasculares, aneurismas micóticos (por êmbolos sépticos), distúrbios hematológicos (como leucemias), terapia anticoagulante e tumores (principalmente glioblastomas ou metástases). As hemorragias intracerebrais traumáticas são geralmente associadas a contusões.

As hemorragias subaracnóideas são causadas quase sempre pela ruptura de aneurismas das artérias da base cerebral.
 

HEMORRAGIA  CEREBRAL  HIPERTENSIVA

É uma forma comum de hemorragia intracerebral espontânea, ocorrendo a partir da meia idade, na vigência de hipertensão sistêmica crônica, geralmente do tipo essencial benigna. Caracteriza-se pela formação em poucas horas de um hematoma intracerebral, mais comumente nos núcleos da base, causando hipertensão intracraniana, déficits neurológicos progressivos, como hemiplegia, perda da consciência, e elevada mortalidade.

Aspecto macroscópico

A localização nos núcleos da base ou tálamo corresponde à grande maioria dos casos. Outras áreas afetadas são a ponte (geralmente a porção basilar) e o cerebelo (geralmente a substância branca de um dos hemisférios). Hemorragias hipertensivas na substância branca dos hemisférios cerebrais têm incidência variável em estatísticas.
 

Localizações clássicas das hemorragias hipertensivas:
Núcleos da base, Ponte e Cerebelo

Nos núcleos da base, a hemorragia é geralmente unilateral, na margem externa do putamen. As hemorragias mais externas são menos propensas a romper-se para o ventrículo que as situadas na porção medial dos núcleos da base. Enquanto os hematomas mais externos podem ser esvaziados cirurgicamente, os internos causam inundação ventricular hemorrágica, e são bem mais graves.

Os hematomas pontinos e cerebelares inundam o IVº ventrículo e têm também mau prognóstico.

Ao exame externo, nota-se edema cerebral (aumento difuso do volume, achatamento dos giros e apagamento dos sulcos) e pode haver hérnias. Se há inundação ventricular, nota-se sangue na cisterna magna ou no espaço subaracnóideo da convexidade, mas pode não haver sinal externo da hemorragia.

Em cortes frontais, o hematoma é arredondado, com diâmetro de 3 a 5 cm, bem delimitado do tecido cerebral. Pode haver hemorragias bem mais volumosas. O hematoma tende a não destruir, mas sim separar estruturas, p. ex., afastando a margem externa do putamen do córtex insular.

Em cortes axiais  (ou horizontais), o hematoma é alongado em sentido ântero-posterior, tendo forma triangular ou de lente biconvexa. O hematoma lesa a cápsula interna, o que explica a hemiplegia. Quando se rompe para o ventrículo lateral, o faz pelo ângulo súpero-externo deste. O sangue dilata os ventrículos, inclusive o IVº ventrículo, e pode sair para as cisternas da base.

Quando o óbito ocorre em poucos dias, o hematoma tem cor negra e é mole se o encéfalo for cortado a fresco. Se for fixado, a consistência fica firme. Se o paciente sobreviver semanas ou meses, haverá reabsorção do hematoma, deixando cavidade colabada com cor ferruginosa.

Além dos hematomas, são freqüentes hemorragias milimétricas, redondas (esferulares) ou em forma de fenda, em que o sangue disseca ao longo de feixes de axônios. Podem ser observadas em qualquer local, inclusive na substância branca.

Aspecto microscópico

Histologicamente, o tecido nervoso na margem do hematoma mostra necrose, infiltração por sangue, células grânulo-adiposas e astrócitos gemistocíticos. Em fases posteriores, há macrófagos com grânulos de hemossiderina e astrócitos fibrosos.

Patogênese

As hemorragias hipertensivas são atribuídas aos microaneurismas de Charcot e Bouchard, descritos em 1868. Estudos angiográficos em cadáveres revelaram que estes aneurismas são comuns em cérebros de hipertensos, embora também possam ocorrer em normotensos. Seu número variou de 9 a 80 por caso, sendo comumente cerca de 20. Foram encontrados nos núcleos da base, substância branca subcortical, ponte e cerebelo em ordem decrescente. Seu diâmetro é de cerca de 0,5 mm.,  forma sacular, sendo às vezes parcial- ou totalmente trombosados. A presença destes microaneurismas em hipertensos, nos locais habituais de hemorragias hipertensivas sugere fortemente uma relação causal, embora, após a hemorragia, seja muito difícil a comprovação morfológica.

Em normotensos, as artérias responsáveis pelas hemorragias hipertensivas são resistentes a pressões muito superiores à pressão arterial sistólica. Admite-se que a hipertensão duradoura cause degeneração das células musculares lisas das mesmas, com substituição por tecido fibroso e enfraquecimento da parede.

As artérias que irrigam os núcleos da base são ramos diretos do tronco da A. cerebral média, portanto, a pressão neles é elevada, semelhante à da própria cerebral média. O mesmo se dá nas artérias que irrigam a ponte, ramos diretos da A. basilar. A pressão alta favoreceria nestes ramos o aparecimento dos microaneurismas.

Clínica

É MUITO DIFÍCIL DISTINGUIR CLINICAMENTE O ACIDENTE VASCULAR HEMORRÁGICO DO ISQUÊMICO.

  • Clinicamente, a hemorragia hipertensiva causa um quadro deficitário de instalação rápida, com sinais de localização e perda da consciência em minutos a horas, dependendo da rapidez do sangramento e do volume atingido pelo hematoma.
  • O exame do líquor pode mostrá-lo francamente hemorrágico quando houver ruptura do hematoma para o ventrículo. Porém líquor claro não afasta acidente hemorrágico, se o hematoma permanecer intraparenquimatoso.
  • O diagnóstico é feito por tomografia computadorizada. A ressonância magnética não é um bom método para demonstrar hemorragias agudas.
  • Hematoma roto nos ventrículos têm evolução grave, complicada por edema cerebral e hérnias. Hematomas menores podem permitir sobrevida com déficits.


MALFORMAÇÕES  VASCULARES NO  S.N.C.

Podem ser de três tipos: a) telangiectasias; b) hemangiomas cavernosos ou cavernomas ; c) malformações artério-venosas (MAVs).

Telangiectasias são grupos de capilares dilatados, que aparecem como uma pequena área solitária avermelhada ou arroxeada, ou como um grupo de petéquias. Sua localização mais freqüente é na ponte, ou no córtex cerebral e substância branca adjacente. São mais encontradas na meia idade.
Microscopicamente, os capilares dilatados são constituídos por células endoteliais normais e o tecido nervoso entre eles é também normal. Geralmente as telangiectasias não sangram, constituindo achados de necrópsia.

Hemangiomas cavernosos ou cavernomas são encontrados na meia idade nos hemisférios cerebrais, podendo ser múltiplos.
Macroscopicamente, são enovelados de vasos anormais densamente agrupados e praticamente sem tecido nervoso entre si. São bem delimitados, não-encapsulados, de cor vermelho-vinhosa, pardacenta ou amarelada, devido à hemossiderose por hemorragias anteriores. O tamanho varia de minúsculos a volumosos.
Histologicamente, mostram vasos tortuosos, de parede ora espessa, ora delgada, com fibrose, hialinização e calcificações. Freqüentemente há trombos. O tecido nervoso em volta mostra gliose e hemossiderose.
Clinicamente, os hemangiomas podem ser assintomáticos ou causar sintomas conforme sua localização, como crises convulsivas focais e hemiparesia. Quando se rompem, podem originar hemorragias intraparenquimatosas maciças, com inundação ventricular.

Malformações artério-venosas são constituídas por artérias e veias tortuosas, freqüentemente com trajetos fistulosos entre si (fístulas artério-venosas) e dilatações varicosas. Os vasos são separados por tecido nervoso gliótico e com hemossiderose. São mais comuns no território da A. cerebral média. Envolvem mais a leptomeninge e em menor grau o córtex cerebral e substância branca. Podem chegar até os ventrículos laterais.
Histologicamente são semelhantes aos hemangiomas, mas há tecido nervoso separando os vasos. Não raro é difícil decidir se um vaso é artéria ou veia, tal o grau de anormalidade.
Clinicamente, as malformações A-V podem ser assintomáticas ou provocar cefaléia, hemiparesia ou epilepsia. Quando volumosas podem produzir curto-circuitos artério-venosos com aumento do débito cardíaco e sopro audível com estetoscópio. Podem causar hemorragias subaracnóideas ou intraparenquimatosas, que podem ser fatais. Há maior incidência no sexo masculino (2 : 1) e os primeiros sintomas são observados entre a 2ª e a 4ª décadas.
 

ANEURISMAS MICÓTICOS

(O termo micótico é impróprio, pois a causa comum, clássica, é bacteriana).
Resultam da obstrução de uma arteria (geralmente um ramo da A. cerebral média) por um êmbolo séptico. A fonte mais comum é uma endocardite bacteriana subaguda (Streptococcus viridans) ou veias pulmonares proximas a um foco supurativo, p.ex., bronquiectasias.
As bactérias no êmbolo causam necrose da artéria, formando um aneurisma pequeno, que se rompe causando hemorragia intraparenquimatosa e/ou subaracnóidea, geralmente fatal.
Quando uma hemorragia cerebral está fora das localizações clássicas da hemorragia hipertensiva, deve-se considerar o aneurisma micótico como uma das possibilidades etiológicas.

HEMORRAGIAS EM TUMORES CEREBRAIS

Tumores são causas relativamente raras de hemorragia cerebral.
Metástases dão mais hemorragias que os gliomas, principalmente as de melanoma maligno e de coriocarcinoma.
Dentre os gliomas, o glioblastoma multiforme é o que mais produz hemorragias, (cerca de 1% dos casos).
A hemorragia pode ser a primeira manifestação do tumor ou complicar um quadro clínico já instalado.
 

HEMORRAGIAS CEREBRAIS EM DOENÇAS HEMATOLÓGICAS

Doenças que evoluem com plaquetopenia, como leucemias, anemias aplásicas e púrpura trombocitopênica, e terapia anticoagulante podem apresentar hemorragia cerebral como complicação.
Geralmente são hemorragias multicêntricas na substância branca dos hemisférios cerebrais e do cerebelo, com evolução grave. Muitas vezes são o evento terminal da doença.
Admite-se que as devidas a leucemias ocorrem por obstrução ou lesão de pequenos vasos cerebrais pela grande quantidade de células leucêmicas.


 
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Banco de imagens:  Hemorragias  hipertensivas

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leucêmica
Cavernoma Malformação artério-venosa (MAV)

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