Ganglioglioma  desmoplásico  infantil
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Masc., 11 anos,  cefaléia crônica, sem convulsões e sem déficit motor. TC, RM:  lesão bem delimitada, captante, região parietal. Espécime cirúrgico - Nódulo de 3 cm de diâmetro, endurecido, esbranquiçado, parcialmente recoberto por parênquima cerebral. 

Abaixo, imagens escaneadas das lâminas, em HE (em cima) e tricrômico de Masson (embaixo). Fica evidente o caráter bem delimitado da lesão.  Na parte central de dois dos cortes (o inferior do centro e o da E) há pequena área hialinizada e calcificada.  No tricrômico de Masson observam-se tecidos corados em azul e lilás. O azul (azul de anilina), mais abundante, corresponde a fibras colágenas; o lilás (fucsina) é tecido nervoso, ou seja, o componente astrocitário do tumor. Na HE esta distinção é difícil, porque os dois tipos de tecido se coram em róseo.  O tecido astrocitário é mais notado na periferia do nódulo. O centro é constituído principalmente por tecido colágeno denso.  Há, porém, amplo imbricamento entre os dois tipos de tecido, demonstrado nos quadros mais abaixo. 

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Componente de tecido fibroso denso.  A maior parte do tumor é constituída por tecido fibroso colágeno muito denso e paucicelular. Os feixes de fibras colágenas estão orientados em várias direções.  Os núcleos dos fibroblastos são pequenos e com cromatina densa. 
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Porção central hialinizada e calcificada. 
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Área com melanócitos.  Numa única região observaram-se células contendo pigmento melânico entre os fibroblastos da parte desmoplásica do tumor. O pigmento é marrom, de grãos muito finos e regulares. Melanócitos como estes são habitualmente vistos nas leptomeninges. 
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A periferia da lesão é constituída por tecido nervoso. Parte tem neurônios piramidais, encontrados no córtex cerebral. O restante é tecido neoplásico astrocitário densamente fibrilar e parcialmente calcificado. 
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Outra área da periferia. O tumor propriamente dito (astrocitoma, à E na foto) está situado externamente ao tecido colágeno (à D na foto). A margem externa havia sido pintada com tinta nanquim, daí as manchas mais pardacentas. 
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Nesta área observou-se infiltrado linfocitário em torno de uma vênula.  No tecido tumoral foram vistas fibras de Rosenthal, próprias do astrocitoma pilocítico e de gliose de longa duração. 
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Neurônios piramidais do córtex cerebral encontrados em outra área da periferia do tumor. Os dendritos apicais apontam para a superfície meníngea (à D, mas não representada no material). O tumor acha-se à E (fora deste campo), indicando que está situado abaixo do córtex, e provavelmente sem relação direta com a meninge.
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ÁREA DE GANGLIOGLIOMA.  Em algumas áreas onde o tecido neuroectodérmico estava entremeado ao tecido fibroso, foi possível caracterizar o tumor como um ganglioglioma, pelo encontro de neurônios em meio aos astrócitos neoplásicos. Os neurônios variavam em tamanho e não tinham forma piramidal, não sendo, portanto, pertencentes ao córtex cerebral. Seu núcleo era vesiculoso, com nucléolo evidente e em vários se observava citoplasma de limites nítidos. 
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Tricrômico de Masson. Cora as fibras colágenas em azul, permitindo destacá-las do tecido glial, que se cora em vermelho ou lilás.  Nas fotos abaixo, ver o íntimo imbricamento entre os dois tipos de tecido que constituem o tumor. 
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ÁREA DE GANGLIOGLIOMA.  Em algumas das áreas coradas em vermelho é possível obervar neurônios, como já notado em HE, justificando o diagnóstico final de ganglioglioma desmoplásico infantil.

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Astrocitomas e gangliogliomas desmoplásicos infantis. 
 

Definição.  Entidade clinico-patológica caracterizada por tumores grandes que envolvem o córtex cerebral superficial e as leptomeninges, são geralmente aderidos à dura e ocorrem em crianças pequenas, com prognóstico geralmente bom após ressecção cirúrgica. Apresentam uma porção superficial sólida e um componente cístico na profundidade.  Consistem de estroma desmoplásico proeminente e uma população de células neuroepiteliais. No astrocitoma cerebral desmoplásico da infância (DIA) as células neuroepiteliais são restritas a astrócitos. No ganglioglioma desmoplásico infantil (DIG), os astrócitos estão associados a um componente variável de neurônios .  Nos dois tumores, há grupos de células pouco diferenciadas. Ambos são considerados de baixo grau de malignidade (grau I da OMS). 

Histórico.  O astrocitoma cerebral desmoplásico da infância foi originalmente descrito por Taratuto et al. em 1982 como um astrocitoma meningocerebral, aderido à dura e com reação desmoplásica. Em 1987 VandenBerg et al. descreveram tumor semelhante com diferenciação divergente para neurônios e glia (ganglioglioma desmoplásico infantil), e salientaram a presença de células neuroepiteliais imaturas.  Atualmente ambos são considerados variantes da mesma entidade, dependendo apenas da identificação ou não de neurônios no espécime. 

Incidência. São raros. Em uma série de 6500 tumores do SNC, foram descritos 22 casos de ganglioglioma desmoplásico infantil e há pelo menos 16 casos de outros laboratórios.  A idade dos 55 casos conhecidos de DIA/DIG é 1 a 24 meses, média de 6 meses, e relação masculino / feminino de 1.6:1.  Os tumores invariavelmente originam-se em posição supratentorial, comumente envolvem mais de um lobo, preferencialmente o frontal e o parietal, depois o temporal e, raramente, o occipital. 

Clínica. Sinais e sintomas de curta duração. Aumento do perímetro cefálico, fontanela abaulada e sinal do sol poente. Pode haver paresias, convulsões, hipertonia e hiperreflexia. 

Imagem e macroscopia. Na TC, massa grande, hipodensa e cística, com porção superficial sólida, isodensa ou discretamente hiperdensa,  que capta contraste.  Podem chegar a 13 cm. de diâmetro. Há cistos profundos, uni ou multiloculados preenchidos por líquido claro ou xantocrômico. A porção sólida superficial envolve leptomeninges e córtex superficial. É de consistência firme, cor branca ou acinzentada e comumente aderida à dura-máter. Não há hemorragia ou necrose. 

Microscopia.  No DIA, astrócitos são o elemento neuroepitelial predominante, principalmente nas regiões mais desmoplásicas, onde se nota componente mesenquimal variável. No DIG, além destes elementos, há células ganglionares neoplásicas. 

A porção principal do tumor, situada na leptomeninge, consiste de células astrocitárias alongadas e fusiformes, cujos prolongamentos são arranjados em fascículos, em disposição estoriforme, ou em redemoinhos. Os prolongamentos destes astrócitos estão misturados a fibras colágenas ou reticulínicas que circundam as células neoplásicas, dando impressão de um tumor mesenquimal. Pode haver formas gemistocíticas. 

No caso do ganglioglioma, há um componente neuronal heterogêneo, formado por pequenas células poligonais e células ganglionares típicas ou atípicas. Estas são mais facilmente observadas onde a matriz extracelular é menos abundante. Além disso, há agregados de células neuroepiteliais pouco diferenciadas, caracterizadas por núcleos muito basófilos, pequenos e redondos, e pericários pequenos. Ocorrem em extensão variável em ambos tumores. 

Em contraste com gangliogliomas do adulto, o componente neuronal dos gangliogliomas desmoplásicos infantis é geralmente mais imaturo e atípico. Mesmo que os gangliogliomas desmoplásicos infantis tenham celularidade maior, atipias e células primitivas, o prognóstico, com ressecção adequada é favorável (abaixo). 

Gangliogliomas de adultos têm considerável variação na quantidade de estroma fibrovascular, que pode ser proeminente. Têm também astrócitos e neurônios melhor diferenciados que nos tumores infantis, e não têm uma população de células primitivas. Não se deve considerar que gangliogliomas com desmoplasia em adultos são equivalentes aos gangliogliomas desmoplásicos infantis.

Há nítida demarcação entre o tumor desmoplásico e a superfície cortical. Atividade mitótica e necrose são raras. Quando presentes, restringem-se às células neuroepiteliais pouco diferenciadas. Não há proliferação vascular. 

Imunohistoquímica.   Células gliais expressam GFAP, vimentina e S-100. Diferenciação neuronal é revelada por sinaptofisina e neurofilamento. As células pouco diferenciadas podem reagir para marcadores neuronais e gliais. Células mesenquimais (e também as gliais) expressam vimentina.  Anticorpos para colágeno tipo IV formam um retículo em volta das células tumorais. 

Microscopia eletrônica. As células astrocitárias são circundadas completamente por lâmina basal. Fibroblastos são encontrados em áreas ricas em colágeno. No DIG, foram descritos neurônios com grânulos secretórios de centro denso (dense core) e neurofilamentos. Sinapses, axônios mielínicos ou células de Schwann não são encontrados. 

Proliferação. Atividade mitótica é rara e restringe-se às pequenas células indiferenciadas. Marcação com Ki-67 varia de menos de 0.5% até 5%.

Histogênese. Anomalias do desenvolvimento, como ectopias neuronais ou gliais no espaço subaracnóideo, podem ter papel na gênese destes tumores. Estas anomalias poderiam decorrer de mutações genéticas, hipóxia ou lesão física ou química durante o desenvolvimento cerebral. A presença de astrócitos neoplásicos circundados por membrana basal, além da localização superficial, sugere que estes tumores poderiam originar-se de astrócitos subpiais. Aspecto semelhante é encontrado no xantoastrocitoma pleomórfico. Relatou-se que proteínas da membrana basal inibem o crescimento e promovem a diferenciação em células gliomatosas. O prognóstico favorável seria devido à produção de componentes de membrana basal pelas células tumorais, que levaria de forma autócrina à sua maturação ou diferenciação. 

Prognóstico. Em 8 pacientes com DIA foi feito seguimento de 8.3 a 20 anos (média, 15.1 anos). Destes, 6 sobreviveram (2 morreram logo após a cirurgia). Foram seguidos 14 pacientes com DIG, que tiveram sobrevidas de 1 a 14.1 anos (média 8,7 anos). Nenhuma morte resultou de tumor residual ou recidivado. Ressecção macroscopicamente completa geralmente resulta em longa sobrevida. 

Fonte principal: Taratuto AL, VandenBerg SR, Rorke LB.  Desmoplastic infantile astrocytoma and ganglioglioma.  in P. Kleihues, WK Cavenee (eds): Tumours of the Nervous System. Pathology & Genetics.  WHO Classification of Tumours. IARC Press, Lyon, 2000. 

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