Comentários.
Este
paciente apresentou um linfoma cuja primeira manifestação
foi perda de força muscular nos MMII, devida ao acometimento da
medula espinal pelo tumor. Inicialmente, a suspeita diagnóstica
recaiu sobre uma doença desmielinizante, reforçada pela presença
de lesões múltiplas também nos hemisférios
cerebrais na RM, que se impregnavam por constraste. A melhoria dos sintomas
com corticosteróides apoiou o diagnóstico de esclerose múltipla.
Ao longo do curso foram introduzidos quimioterápicos imunosupressores
(metotrexate), que levaram a leucopenia e plaquetopenia. Esta última
resultou em múltiplas hemorragias cerebrais que foram a causa do
óbito. O diagnóstico final de linfoma só foi estabelecido
na autópsia.
Havia acometimento
de fígado, baço e linfonodos abdominais, além do sistema
nervoso. A medula óssea dos corpos vertebrais mostrava-se
moderadamente hipercelular, com poucos adipócitos, e todas as séries
hemopoiéticas estavam representadas. Observaram-se focos de necrose,
que poderiam resultar de infiltração pelo linfoma, mas não
foi encontrada infiltração linfomatosa viável. Havia
discreta hemofagocitose, considerada achado inespecífico.
Nos vários hemogramas realizados durante o acompanhamento clínico,
não houve evidência de manifestação leucêmica.
As feições
histológicas do linfoma lembravam um linfoma T, pela variação
do tamanho dos núcleos celulares de pequenos a grandes, com formas
intermediárias. A linhagem T foi confirmada pela positividade
para CD3 e negatividade para CD20. Outra feição encontrada
em linfomas T foi o caráter angiocêntrico, ou seja, a tendência
das células neoplásicas a invasão e destruição
das paredes vasculares. Isto pode ter sido responsável pelas extensas
áreas de necrose vistas no baço e linfonodos, e pelas múltiplas
hemorragias no sistema nervoso central, que foram a causa imediata do óbito
por hipertensão intracraniana e hérnia de amígdalas.
A positividade
para EBER (RNAs curtos do virus de Epstein-Barr) por hibridização
in situ é observada nos linfomas Hodgkin (no caso, afastado pelos
caracteres histológicos e negatividade para CD30 e CD15), nos linfomas
do tipo Burkitt e nos linfomas NK. Os linfomas NK (oriundos de células
NK ou natural killer) são habitualmente positivos para CD56
e negativos para CD57 (o presente caso se comportou de forma inversa).
Porém, CD57 é considerado um marcador de linfomas NK (Leong
et al, 1999). Linfomas NK são comuns em países orientais
e raros no ocidente, e têm predileção pela região
nasal. O paciente em questão não tinha queixas rinológicas.
Como a suspeita de linfoma NK foi levantada só a posteriori, não
foi feita na autópsia uma investigação para tumor
da região nasal.
Em conclusão,
trata-se de um raro caso de linfoma T sistêmico com acometimento
secundário ou simultâneo do SNC. A positividade para EBER
e CD57 sugere fortemente que se trate de um linfoma T/NK.
Ref. Leong
AS-Y, Cooper K, Leong FJW-M. Manual of Diagnostic Antobodies for
Immunohistology. Greenwich Medical Media Ltd, London, 1999, p 103.
Agradecimentos.
Ao Dr. Leandro Luiz Lopes de Freitas e ao Prof. Dr. José Vassallo,
do Depto de Anatomia Patológica da FCM-UNICAMP, pela orientação
da imunohistoquímica e tipagem do linfoma neste caso. |