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lesões antigas e recentes |
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Peça
C-31. Endocardite mitral reumatismal: lesões antigas
e recentes. Este coração
aberto mostra estenose da valva mitral, com dilatação do
átrio esquerdo, que contrasta com o ventrículo esquerdo de
volume normal. Também não há hipertrofia visível
do miocárdio do VE, sugerindo que o componente de refluxo (portanto,
de insuficiência) da valva não era hemodinamicamente relevante.
O motivo da dilatação do AE está nas lesões reumáticas da valva mitral. As lacínias estão espessadas, fundidas a nível da comissura, e as cordoalhas tendíneas, que ancoram as lacínias ao músculo papilar, também estão mais espessas, encurtadas e parcialmente fundidas. Estas alterações são seqüelas das lesões inflamatórias da febre reumática. As pequenas vegetações trombóticas observadas no bordo de fechamento das lacínias são evidência de processo inflamatório em andamento na época do óbito. Essas lesões provocaram lesão do endocárdio valvar e deposição de plaquetas e fibrina. Posteriormente, a lesão inflamatória produziria outro ciclo de reparo, levando a fibrose ainda maior da valva e maior disfunção hemodinâmica. Casos assim estão representados nas peças seguintes. Esta peça (C-31), por apresentar lesões agudas e crônicas associadas, testemunha a natureza recidivante das lesões reumatismais, levando a piora progressiva da deformidade das valvas. |
A febre reumática tem origem em uma infecção, geralmente da garganta (faringites, amigdalites) ou da pele (piodermites) por um estreptococo b-hemolítico do grupo A. Antígenos da parede da bactéria causam a formação de anticorpos, que reagem de forma cruzada com antígenos do coração, resultando em focos inflamatórios nas três camadas do órgão. Fala-se então em pancardite reumatismal, uma somatória de pericardite, miocardite e endocardite (ver estas lesões na lâmina A. 181). As lesões não são causadas por bactérias agindo diretamente nos tecidos do coração. No endocárdio, as lesões mais importantes ocorrem no endocárdio valvar. A reação antígeno-anticorpo a nível do tecido (reação de hipersensibilidade do tipo II) leva a fixação do complemento, com lesão tecidual e liberação de frações quimiotáticas para neutrófilos e macrófagos. Os macrófagos fagocitam o material fibrinóide formando granulomas, conhecidos como nódulos de Aschoff (lâmina A. 181). Posteriormente, as lesões inflamatórias diminuem em intensidade. Há formação de tecido de granulação e cicatriz fibrosa (portanto, processo de reparo). A cada nova infecção pelo mesmo germe, repete-se o ciclo e a fibrose valvar se agrava. Na valva mitral, há espessamento e encurtamento, tanto das lacínias como das cordoalhas tendíneas. Os pequenos trombos que se formam durante a fase aguda sobre o endocárdio lesado também sofrem organização e contribuem para a fibrose. A nível das comissuras (isto é, onde a borda da lacínia chega até o anel de inserção da valva), a fibrose leva a fusão das lacínias. A longo prazo, a valva mitral sofre a chamada disfunção completa: há estenose e insuficiência, ou seja, a valva nem abre bem na sístole, nem fecha completamente na diástole. Das duas, a estenose é que predomina. A valva com as lacínias fundidas tem um orifício central comparável a uma casa de botão, e sua área livre é só uma fração da original. A retração das cordoalhas puxa a valva para baixo, em direção do ventrículo, dando-lhe aspecto em funil (ver peça C-11). A dificuldade da passagem para o ventrículo leva a represamento do sangue no átrio esquerdo, com dilatação que pode ser enorme (ver peça C-28A), lentificação de fluxo e trombose. Na valva aórtica as alterações são essencialmente semelhantes. Há também fibrose e retração das lacínias (levando a insuficiência) e fusão das comissuras (levando a estenose). As valvas direitas são menos acometidas. Das duas, as lesões predominam na tricúspide. Alterações na valva pulmonar são raras. |
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