Diagnóstico:
Atrofia prostática (subtipo hiperplásico).
Comentário: A atrofia
prostática é uma das lesões
que mais freqüentemente simulam adenocarcinoma. Ela ocorre com
maior freqüência
no lobo posterior ou zona periférica (1-3) e ganhou
importância com o aumento
do uso da biópsia prostática de agulha(4). Moore (1), em
1936, foi um dos
primeiros autores a descrever a atrofia prostática num estudo
sistemático em
autópsias.
Por que esta
lesão
simula adenocarcinoma? Histologicamente a atrofia prostática
pode ser parcial
ou completa. Esta última pode ser subtipada em simples,
hiperplásica (ou
hiperplasia pós-atrófica) e esclerosante (5). Parece que
os subtipos
representam um contínuo morfológico de uma mesma
lesão (4). A atrofia parcial e
a hiperplásica (ou hiperplasia pós-atrófica)
são os subtipos que mais freqüentemente
simulam adenocarcinoma. A atrofia hiperplásica mostra pequenos
ácinos próximos
entre si e revestidos por epitélio atrófico. Fibrose pode
ou não estar presente
no estroma. Quando presente, a proliferação é
irregular e pode resultar em
distorção dos ácinos simulando
infiltração do estroma. A atrofia parcial foi
descrita por Oppenheimer e cols. (6). O nome é devido ao fato de
que há preservação
parcial do citoplasma simulando micro-ácinos neoplásicos.
Uma armadilha
adicional para o patologista cirúrgico observando atrofia
parcial é o fato de
as células basais estarem espaçadas e em alguns
ácinos inclusive totalmente
ausentes (V. Caso 52).
O
diagnóstico de atrofia prostática é feito de
acordo com os seguintes achados
(5,7): 1. preservação
da arquitetura lobular da glândula (Figs. 1-4); 2. aspecto
simulando infiltração
em bloco e, não, glândulas individuais se infiltrando de
permeio a glândulas
benignas maiores; 3. aspecto basófilo das glândulas
atróficas devido à escassez
de citoplasma das células (Fig.5); 4. núcleos
irregularmente dispostos ao
contrário da tendência de ordenação em fila
e numa única camada como no
adenocarcinoma; 5. presença da camada de células basais;
e, 6. freqüente
elastose do estroma (Fig.5).
Existem alguns achados associados
com a etiopatogênese da lesão. A atrofia está
nitidamente associada com o
aumento da idade (1,5). A radioterapia e o bloqueio hormonal
estão associados
com atrofia difusa. Inflamação ativa ou inativa é
causa freqüente da lesão (8)
e num estudo feito em autópsias há evidência que a
isquemia crônica local
também pode ser causa de atrofia (5). Entretanto, muitos
exemplos de atrofia
ainda são considerados como de natureza desconhecida. Tanto a
inflamação como a
isquemia são associadas com formas focais de atrofia.
Uma possível relação da atrofia com
neoplasia é desafiadora e controvertida. O termo "atrofia
proliferativa
inflamatória" foi proposto por De Marzo e cols. (9) para
designar focos
discretos de epitélio glandular proliferado com aspecto
morfológico de atrofia
simples ou hiperplasia pós-atrófica ocorrendo em
associação com inflamação.
Estes autores sugerem que a atrofia proliferativa pode dar origem ao
carcinoma
diretamente ou indiretamente progredindo para neoplasia intraepitelial
prostática
(NIP) alto grau. Outros estudos, entretanto, não apóiam
estes achados (5, 10-13).
Na rotina diagnóstica não é raro
encontrarmos pacientes com antígeno-específico da
próstata (PSA) elevado e
várias biópsias mostrando apenas
atrofia
prostática. Independente da causa de atrofia, nós
levantamos a hipótese de que
células lesadas em ácinos atróficos poderiam ser
causa de elevação de PSA. Fizemos
um estudo em 131 biópsias prostáticas de agulha
correspondendo a 107 pacientes.
O único diagnóstico em todas as biópsias foi
atrofia prostática focal sem
presença de carcinoma, neoplasia intraepitelial
prostática (NIP) alto grau, ou
áreas suspeitas de adenocarcinoma. Foi encontrada uma
associação positiva e
estatisticamente significante entre extensão de atrofia e
elevação de PSA livre
ou total (14). Todos os pacientes mostrando extensão linear de
atrofia 35mm ou
maior no total dos cortes da biópsia tinham PSA superior a
4ng/mL. Os achados
sugerem que células epiteliais lesadas nos ácinos
atróficos, independente da
causa, podem ser fonte de elevação de PSA sérico.
O antígeno-específico da próstata
é
uma glicoproteína de cadeia simples com atividade
enzimática proteolítica
contra a proteína principal formadora de gel do ejaculado
(semengelina). O PSA
induz a liquefação do semen permitindo a
liberação de espermatozóides progressivamente
mostrando motilidade (15). Existem várias barreiras
fisiológicas eficientes que
impedem o escape de quantidades significantes de PSA do sistema ductal
prostático: a membrana basal dos ácinos, as
células basais, o estroma
prostático, a membrana basal dos capilares e as células
endoteliais. Esta
barreiras normalmente impedem o PSA de entrar na
circulação geral numa
concentração superior a 3ng/mL (15).
A atrofia prostática focal
representa uma forma de resposta adaptativa a uma lesão mais
freqüentemente
devido a inflamação e/ou isquemia local. É
intrigante que ácinos atróficos
possam produzir excesso de PSA sérico. Inflamação
e/ou isquemia são estímulos
lesivos resultantes de fosforilação oxidativa
diminuída, lesão de membranas
basais, entrada de cálcio nas células e acúmulo de
radicais livres derivados de
oxigênio (stress oxidativo) (16). Nós
especulamos que estes estímulos lesivos possam interferir na
barreira
fisiológica que previne o escape de quantidades significantes de
PSA na
circulação geral (17).
A atrofia prostática é uma lesão
freqüente, desafiadora, intrigante e assunto para novas pesquisas.
Os
patologistas deveriam incluir no laudo de biópsias
prostáticas de agulha a
presença e extensão de atrofia. Referências 1. Moore RA: The
evolution and involution of the prostate gland. Am J Pathol.
1936;12:599-624. 2. Franks LM:
Atrophy and hyperplasia in the prostate proper. J Pathol Bacteriol.
1954;68:617-21. 3. Liavag I:
Atrophy and regeneration in the pathogenesis of prostatic carcinoma.
Acta
Pathol Microbiol Scand [A]. 1968;73:338-50. 4. Cheville JC,
Bostwick DG: Postatrophic hyperplasia of the prostate. A histologic
mimic of
prostatic adenocarcinoma. Am J Surg Pathol. 1995;19:1068-76. 5. Billis A:
Prostatic atrophy: An autopsy study of a histologic mimic of
adenocarcinoma.
Mod Pathol. 1998;11:47-54. 6. Oppenheimer
JR, Wills ML, Epstein JI: Partial atrophy in prostate needle cores:
another
diagnostic pitfall for the surgical pathologist. Am J Surg Pathol.
1998;22:440-5. 7. Billis A,
Magna LA. Prostate elastosis: a microscopic feature useful for the
diagnosis of
postatrophic hyperplasia. Arch Pathol Lab Med 2000;124:1306-9. 8. Srigley JR:
Benign mimickers of prostate cancer. Mod Pathol. 2004;17:328-48. 9. De Marzo AM, Marchi VL,
Epstein JI, Nelson WG: Proliferative inflammatory atrophy of the
prostate.
Implications for prostatic carcinogenesis. Am J Pathol.
1999;155:1985-92. 10. Anton RC, Kattan MW,
Chakraborty S, Wheeler TM: Postatrophic
hyperplasia of the prostate. Lack of association with prostate cancer.
Am J
Surg Pathol. 1999; 23:932-6. 11. Bakshi NA, Pandya S,
Schervish EW, Wojno KJ: Morphologic features and clinical significance
of
post-atrophic hyperplasia in biopsy specimens of prostate. Mod Pathol. 2002;15:154A. 12. Postma R, Schröder
FH,
and van der Kwast TH: Atrophy in prostate needle biopsy cores and its
relationship to prostate cancer incidence in screened men. Urology.
2005;65:745-9. 13. Billis A, Freitas LLL,
Magna LA, Ferreira U. Inflammatory atrophy on prostate needle biopsies:
Is
there topographic relationship to cancer? Int Braz J Urol
2007;33:355-363. 14. Billis A,
Meirelles LR, Magna LA, Baracat J, Prando A, Ferreira U. Extent of
prostatic
atrophy in needle biopsies and serum PSA levels: is there an
association? Urology.
2007;69:927-30. 15. Oesterling
JE, Lilja H: Prostate-specific antigen. The value of molecular forms
and
age-specific reference ranges. In: Vogelzang NJ, Scardino PT, Shipley
WU,
Coffey DS (eds.), Comprehensive textbook of genitourinary oncology.
Baltimore,
Williams & Wilkins. 1996; pp.668-80. 16. Kumar V,
Abbas AK, Fausto N: Robbins and Cotran Pathologic Basis of Disease, 7th
ed. Philadelphia, Elsevier Sanders.2005; pp.3-46. 17. Billis A.
Inflammatory atrophy on prostate needle
biopsies: Is there topographic relationship to cancer? (Letter to the
Editor)
Int Braz J Urol 2007;33:566-568.
|