CARTA  AOS  ALUNOS
 

O  MÓDULO  INTRODUÇÃO   À   PATOLOGIA

            A Patologia é o ramo da Medicina que se dedica ao estudo das doenças, no seu sentido mais amplo.  O termo vem das palavras gregas pathos (sofrimento) e logos (estudo).  Hoje, a entendemos como a ciência que tenta explicar,  cientificamente, o que são as doenças, como se originam, e como atuam alterando a anatomia e a fisiologia dos órgãos e sistemas. Lança, portanto, as bases racionais do diagnóstico, tratamento e prognóstico. Não seria exagero dizer que a Patologia sensu latu é a espinha dorsal da Medicina moderna.  É ela que fundamenta a Clínica, possibilitando a correta interpretação e valorização de sinais e sintomas. Todas as especialidades médicas estão alicerçadas no estudo da Patologia dos respectivos aparelhos.

Mas, como começou a Patologia ?

            Na Antigüidade, como não havia conhecimento adequado da anatomia ou das funções dos órgãos, as doenças eram imaginadas como desequilíbrios de ‘humores’. Na Idade Média, pouco se avançou, pois dissecções eram proibidas. Foi só a partir do Renascimento, através de estudos anatômicos pormenorizados como o de Vesalius, que a Anatomia Normal foi definida. Este foi o primeiro e indispensável passo. Como distingüir  o anormal sem ter o normal como pano de fundo ?  A partir daí, tudo o que diferia do normal passou a constituir uma alteração patológica.

            Assim nasceu, no século XVIII, a Anatomia Patológica, ou seja, o estudo sistemático das alterações morfológicas que as doenças causam nos órgãos e tecidos. Seu grande pai foi o italiano Morgagni, o primeiro que reuniu suas observações em um livro,  correlacionando os sintomas e sinais clínicos com achados de autópsia.  A Patologia nasceu, portanto, uma ciência morfológica, porque a observação visual direta é fácil e não exige instrumental.

            O próximo grande passo na compreensão das doenças foi a utilização do microscópio para o estudo dos tecidos normais e doentes, e o reconhecimento das células como unidades do organismo vivo.  Temos então a figura exponencial de Virchow, o patologista alemão que abriu as primeiras grandes clareiras no conhecimento da Patologia Celular. Mas foi a partir do século XX que as outras disciplinas começaram verdadeiramente a interagir com a Anatomia Patológica para lançar as bases da Medicina moderna.
 

Os dias atuais.

            Hoje, temos o privilégio de viver em uma era em que a célula e as disfunções que a afetam são compreendidas numa profundidade e detalhe jamais sonhados por estes grandes pioneiros. É, porém,  fundamental salientar que o progresso astronômico que hoje testemunhamos adveio da abordagem multidisciplinar de assuntos complexos, que a morfologia, fisiologia, bioquímica, genética  e biologia molecular isoladamente não poderiam resolver. Foi, portanto, graças a uma conjunção de esforços que o resultado superou em muito a mera soma aritmética das parcelas.

            É esta conscientização sobre o poder extraordinário da abordagem multidisciplinar, da interação de especialistas de diferentes áreas, que está por trás deste módulo de  Introdução à Patologia.  Por 38 anos, desde sua primeira edição em 1965 pela figura emérita do Prof. José Lopes de Faria, até este ano de 2002, o então curso de Patologia Geral esteve a cargo apenas do Departamento de Anatomia Patológica.

            Hoje, nós daquele Departamento damos as boas vindas aos colegas dos Deptos de Patologia Clínica e Genética Médica, que somam esforços aos nossos na grata tarefa de mostrar aos alunos da FCM - UNICAMP quão fascinante pode ser aprofundar-se nas doenças, mergulhar nas complexidades do funcionamento das células e órgãos doentes. O objetivo último deste conhecimento é entender o porquê para tratar corretamente,  aliviar, e se possível,  curar.  Não é isto, pois, o que se espera de um Médico ?

            Procuraremos ver como alterações ao nível do DNA, o patrimônio genético da célula, podem causar lesões morfológicas observáveis já ao simples microscópio óptico. Os  distúrbios bioquímicos nos fluidos corporais, não menos importantes, são campo de nossos colegas da Patologia Clínica e abrem o mundo da Medicina Laboratorial e sua indispensável contribuição diagnóstica.

            É nosso desejo sincero que esta colaboração de três Departamentos dê a vocês, alunos, uma visão mais ampla e integrada dos mecanismos básicos das doenças do que cada um de nós, agindo isoladamente, seria capaz. Que este Módulo seja maior que a somatória de suas partes, e que lhes abra os olhos e a curiosidade para muito mais, ao longo do Curso de Medicina, e de suas vidas.


Prof. Luciano Queiroz, Depto de Anatomia Patológica
Profa. Denise Cavalcanti, Depto de Genética Médica
Prof. Roger Castilho, Depto de Patologia Clínica